terça-feira, 26 de outubro de 2010

QUOTIDIANOS



Colávamos cartazes a noite toda e inicialmente os gestos eram difíceis e estudados – a cola que escorria, os pincéis pouco largos, os cartazes finalmente que se enrodilhavam e que eram pequenos no meio das paredes dos quartéis e dos edifícios públicos, as esquinas dos prédios, passávamos a conhecer as várias luzes da noite ao longo das horas, os vários muros da cidade, os candeeiros, e na manhã seguinte olhávamos a cidade que tínhamos repovoado anonimamente com palavras, anúncios de concentrações, cores vermelhas ou amarelas, letras a preto – tínhamos derrotado por dentro mais um bocado do passado.

Eduarda Dionísio em “Retrato Dum Amigo Enquanto Falo”, Armazém das Leras, Lisboa 1979.

Legenda:  Colagens de Ana Hatherly feitas a partir de cartazes arrancados das paredes e muros de Lisboa, a seguir ao 25 de Abril.

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