terça-feira, 12 de outubro de 2010

SARAMAGUEANDO


Ontem passaram por aqui algumas das azias que a atribuição do Prémio Nobel a José Saramago provocou. Seria agora a vez dos elogios. Mas são centenas e centenas e seria fastidioso trazê-los aqui.

Aliás o escritor Mário de Carvalho escreveu no “JL”, de 21 de Outubro de 1998, referindo o Nobel atribuído a Saramago, escreveu um artigo que terminava assim:

“Resisti um bocado a escrever estas linhas. E ter-me-ia escapado, se não fosse a resistência, de certo modo firme, de quem me encomendou a prosa. Neste momento de euforia, abençoada euforia, toda a gente tem coisas para dizer. Em alguns casos vem-me ao espírito aquela expressão brasileira do “papagaio do pirata”. Sabem o que são os “papagaios do pirata? São aqueles tipos que se atrelam às celebridades e aproveitam para se mostrarem por cima do ombro delas quando as câmaras começam a filmar. O José Saramago está neste momento a ser assediado por milhentos “papagaios de pirata”. É natural, e é humano. Mas eu preferia não estar entre eles.”

Assim colocada a questão, limito-me a ir buscar um elogio.

Aquele que António Rego Chaves escreveu no “Diário de Notícias” de 9 de Outubro de 1998
Esse elogio remete para uma crónica que António Rego Chaves publicara, meses antes, na edição de 11 de Abril de 1968 do “Diário de Notícias”, ainda José Saramago não era Nobel.

Começava assim essa crónica:

“O escritor José Saramago que esteve recentemente em Chiapas, tendo conversado com os sobreviventes da matança de Acteal no lugar da chacina e visitado o campo de refugiados de Polhó, entregou um comovido depoimento à revista semanal do jornal espanhol “El Mundo”. Algumas frases a não esquecer:
“Se alguma vez houve na história da Humanidade uma guerra desigual, não houve nunca uma como esta. É uma guerra de desprezo, desprezo para com os indígenas. O Governo esperava que com o tempo acabassem todos, simplesmente isso. Mas eles sobrevivem, alimentando-se da sua própria dignidade. Não têm nada mas são tudo (…) A palavra Chiapas não estará ausente um só dia da minha vida. Se temos consciência mas não a utilizamos para nos aproximarmos do sofrimento, de que nos serve a consciência.”

António Rego Chaves fechava, deste modo, a crónica:

“Já tardava. Já tardava termos um escritor português vivo de renome internacional que se dignificasse e nos dignificasse por tornar público um gesto de fraternidade que ultrapassasse as fronteiras ontológicas do seu querido umbigo e dos bairros que lhe são adjacentes. Já tardava termos bem vivo um cidadão português do mundo, escritor ainda que exilado algures em Tenerife. Obrigado, José Saramago”.

Este não é, de modo algum, um elogio de um “qualquer papagaio do pirata".
Assim como são de sublinhar as palavras de Saramago:

“Se temos consciência mas não a utilizamos para nos aproximarmos do sofrimento, de que nos serve a consciência.”

Sem comentários: