Porém, Antuérpia não é um ponto de chegada, É uma
cidade como as outras: com bares e nevoeiro, o silêncio das coisas, as pessoas,
a matemática impenetrável das suas multiplicações e desmultiplicações, e com a
música dos minutos que se corrompem. Em Antuérpia há prostitutas, há um calor
humano degradado, e a embriaguez. Lá também se morre. Talvez alguém um dia
tenha ressuscitado em Antuérpia. Não sei.
O lugar em que penso é difícil, sempre difícil.
Sei que ao norte existe o rio Escalda. De lá parte-se,
alcança-se o mar. Uma vez, alguém me disse:
A gente que nasce e vive junto do mar é mais pura.
Penso que o mar dá uma qualidade especial à fantasia,
ao desejo e à confiança humana. O mar é uma propriedade misteriosa do espírito,
pela qual nos é ensinado
nada esperar, nada desesperar. Talvez seja isso a
inocência. Talvez só no mar nos seja dado morrer verdadeiramente, morrer como
nenhum homem pode.
Herberto Helder em
Os Passos em Volta
Sem comentários:
Enviar um comentário