quarta-feira, 19 de agosto de 2015

QUOTIDIANOS


Um dia por quinzena os homens descem ao cais de estacas e pranchas de madeira, para esperar o barco que vem da ilha mais próxima. É um barco no estilo dos de pesca, com vela e motor. Quase nunca traz passageiros. Às vezes traz lenha ou farinha de milho. Os homens da ilha vêm sempre assistir à chegada do barco. É como os barcos de pescadores, simétrico, largo ao meio, co0m a popa igual à proa, amarelo e verde ou amarelo e azul. Eles gostam de ver o barco a entrar na pequena baía. Ficam-se a olhá-lo durante o dia inteiro, rondando-o, deslocando-se de uma parte para a outra da praia, para vê-lo do maior número possível de ângulos. Têm a ingenuidade ou sabedoria de sentir nestas contemplações gratuitas a fonte mais certa da verdade do mundo. Gostam de ver as coisas, esgotá-las, Recolhem-se depois com elas. Vivem longamente com a densidade das suas imagens. Disso tudo apuram um encantamento irónico, uma curta inspiração sem finalidades.

Herberto Helder em Photomaton &Vox

Sem comentários: