... e mais uma "Tirada"...
Esta é sobre W.A. e o serviço militar.
"Algures durante
este período (Nota: crise do casamento)
chegou uma carta. Pressenti que poderia ser aquela oferta do Bob Hope que nunca
se tinha materializado. Uma carta de uma fonte anónima é uma coisa
entusiasmante e eu não podia esperar por abri-la. Afinal de contas, era um
aviso para me apresentar ao serviço. Bem, podem imaginar a minha surpresa e o
quanto fiquei encantado. Finalmente uma oportunidade de viver numa caserna com
outros homens, tomar banho com duas dezenas de indivíduos estranhos, partilhar
a casa de banho com tipos chamados Alabama e Texas, e eu seria Brooklyn. Ser
despertado abruptamente às cinco e meia, fazer exercício todo o dia, acatar as
ordens de um Neandertal de cabelo à escovinha e um cérebro com o comprimento de
Plank. E a comida! Finalmente livre de uma dieta de lombo, lagosta,
hambúrgueres no Twenty-One, e o meu Reuben's Special. Ia deixar de comer a
galinha do general Tso, passando a comer o frango do general McArthur. Ou
o que quer que sirvam no exército. Naturalmente ansiava por ver ação. Por me
sentar empilhado e enojado , enquanto a minha barcaça de desembarque oscilava
junto à costa e eu emergia na praia sob uma saraivada de metralhadoras
inimigas. As feridas, o hospital, Harold Russel. Aqui estava a minha
oportunidade de ser um herói, para receber a Medalha de Honra, orgulhoso por
servir o meu país.
Rapidamente contactei
todos os médicos que conhecia e implorei por atestados, alegando que era
fisicamente incapaz. No dia da inspeção médica apareci com toda uma variedade
de álibis, que me declaravam um espécime inválido e prescreviam descanso. Pé
chato, asma, visão fraca, a vesícula biliar, alergias, curvatura da coluna,
hérnia do hiato, luxação no ombro, ombro enrijecido, vertigens, síndroma de
Alice no País das Maravilhas. Tubo carimbado "Sem Provas" pelos
médicos que me examinaram. Reduzido à derradeira entrevista com o psiquiatra,
entreguei-lhe declarações que certificavam a minha psicopatologia, desde as do
meu psiquiatra às do último taxista que me transportara. A situação parecia
demonstrar que eu era, sem dúvida, um 1A. O médico que me examinava pediu-me
que lhe estendesse a mão. Assim fiz, e estava firme e não tremia. Depois
perguntou-me: "Rói sempre as unhas?". Eu não era um compulsivo roedor
de unhas, mas confessei-lhe que tinha esse hábito. Ele observou-me as pontas
dos dedos e, abruptamente, marcou-me como 4F. Rejeitado pelo exército por roer
as unhas. Seria a primeira vez? E que sorte para os outros soldados que teriam
partilhado a caserna comigo. Não teriam de dormir ao lado de um tipo que
soluçaria até adormecer agarrado a um pequeno urso de pano."
(Pág. 111 e 112)
Woody Allen em A Propósito de Nada
Colaboração de Luís
Miguel Mira
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