Insânia
Hélia Correia
Capa: Fernando
Mateus
Relógio D’Água
Editores, Lisboa, 1996
A verdade é que Talívio sonhara sempre com aquele regresso.
Ao contrários dos outros emigrantes, não se antevia a desfiar riquezas até
porque, pensava, de um dia para o outro toda a gente aparecera servida de automóvel,
e de vivenda, e de cartão de crédito. Queria-se a discursar para os Levadeiros,
a conduzi-los por aqueles caminhos da emoção política que em França ele
conhecera apenas em surdina, manietado pela sua condição. Todos lhe apreciavam
o talento de estratego nas lutas sindicais, tanto mais que obviamente ele não
podia usá-lo em benefício da vaidade. No seu próprio país, sim, brilharia,
mesmo falhando, como lhe falhavam, princípios de bom sangue na família. «Numa
democracia como a vossa, qualquer labrego vai a chefe de governo», diziam-lhe
os colegas ao ouvido, entendendo com
isto dar-lhe estímulo.
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