sábado, 5 de outubro de 2019

RELACIONADOS


Prestava serviço militar obrigatório no Regimento de Infantaria nº 5 nas Caldas da Raínha e, por esse motivo, uma qualquer entidade recensearam-me nessa cidade.

Se fossemos votar, tinham-nos avisado de que os nossos votos seriam rigorosamente vigiados.

Decidimos na mesma ir votar em força na Oposição Democrática.

Sabíamos da inutilidade dos nossos votos, mas isso era uma outra história.

Se nas sessões de instrução nocturna fazíamos, em lugar das balelas militares, a leitura de poemas de A Praça da Canção de Manuel Alegre, aquele domingo não era tempo de assobiar para o lado.

Ainda na noite das eleições, o comandante da unidade foi informado da expressão do voto dos milicianos na CDE. O número (cerca de 80) permitiu que não houvesse graves consequências. Quem daria instrução no dia seguinte?

Mas, obviamente, a PIDE ficou a saber das nossas opções políticas.

Copio da Wikipédia:

«As eleições legislativas portuguesas de 1969 foram as primeiras realizadas após a saída de António de Oliveira Salazar da Presidência do Conselho. Decorreram num clima de aparente abertura política, designado por Primavera Marcelista. Realizaram-se no dia 26 de Outubro, tendo concorrido quatro listas: União Nacional ("Lista A"), Comissão Eleitoral de Unidade Democrática ("Lista B"), Comissão Democrática Eleitoral("Lista D") e Comissão Eleitoral Monárquica ("Lista C"). A União Nacional elegeu a totalidade dos 130 deputados, obtendo 980 mil votos. As listas oposicionistas obtiveram somente 133 mil, não conseguindo , no quadro do sistema eleitoral maioritário e plurinominal, eleger qualquer deputado para a Assembleia Nacional.»

Para que a farsa dessas eleições fosse completa, Salazar, em estado vegetal. foi votar. 

Na fotografia que encima o texto, Salazar encontra-se ladeado por uma enfermeira e pela governanta Maria.

As eleições realizaram-se no dia 26 de Outubro de 1969 e no dia 24 Marcelo Caetano dirigira-se à Nação.

São estas as palavras finais da comunicação:


Ficam os títulos dos jornais no dia seguinte às eleições:

Diário de Notícias:

«O Primeiro Grande Resultado da Eleição de Ontem: Vitória do Civismo.

Afluência record e ordem completa.

A Oposição Não Conseguiu Vencer em Nenhum dos Círculos em que se Apresentou e a Assembleia Nacional Será Constituída pelos Deputados que Eram da União Nacional.»

O Século:

»A Expressiva Vontade da Nação: «Sim» ao Prof. Marcelo Caetano.»

Diário da Manhã:

Esmagadora Vitória da Nação Sobre as oposições Ditas Democráticas.

Em números toscos refere-se que, da população maior, em cada 1000, 700 não estavam recenseados; dos 300 recenseados, 115 abstiveram-se, 162 votaram pela União Nacional e 22 pela Oposição Democrática.

Recorde-se, que Mário Soares realizou o seu primeiro acto público de divisionismo constituindo a CEUD contra a CDE.

A ditadura apreciou o sinal. 

Não que os votos da CEUD, juntamente com os da CDE, servissem para eleger um deputado, os dados estavam antecipadamente viciados, mas, como diria o outro, «não havia necessidade!»

Outras histórias!

Sem comentários: