sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

ELEGIA 1969

                                                 Segundo Carlos Drummond de Andrade

Arrastas a escravidão até à velhice

e nada que faças te vale de muito.

Dia após dia passas pelos mesmos gestos,

Tremes na cama, tens fome, desejas uma mulher.

 

Heróis representando vidas de sacrifício e obediência

enchem os parques por onde caminhas.

À noite, no nevoeiro, abrem as umbrelas de bronze

ou então refugiam-se nos vestíbulos vazios dos cinemas.

 

Amas a noite pelo seu poder de destruição,

mas enquanto dormes, os teus problemas irão morrer.

Acordar só prova a existência da Grande Máquina

e a luz árdua cai no teus ombros.

 

Caminhas entre os mortos e falas

de tempos por vir a assuntos do espírito.

A literatura fez-te desperdiçar as melhores horas de amor.

Fins-de-semana perdidos, a limpar a casa.

 

De pronto confessas o teu fracasso e adias

A alegria colectiva para o próximo século. Aceitas

A chuva, a guerra, o desemprego, e a distribuição injusta da riqueza

Porque não podes, sozinho rebentar, rebentar a ilha de Manhattan.

 

Mark Strand 

6 comentários:

Anónimo disse...

Brasileiro por brasileiro, estranha-se que num blogue como este, onde amiúde até se fala de futebol, não haja uma palavrinha ou, no mínimo, uma fotografia em homenagem a Pelé...
Será que decorrido tanto tempo, o ressentimento ainda não passou...? :):):)
Desejo um Bom Ano ao autor do blogue e aos respectivos leitores.
LM

Seve disse...

Desculpe-me a intromissão mas ouso perguntar -que ressentimento?
Só se foi da sova que, no Mundial 1966, em Inglaterra, aplicámos a Pelé e àquela excelente selecção do Brasil (já que refere...passado tanto tempo).
Aproveito para endereçar os nossos sentimentos a toda a família e a todo o povo brasileiro.

Anónimo disse...

Lembro-me muito bem do que refere, Seve.
Se for rever o documentário que se fez acerca desse Mundial de 66, que até teve direito a exibição em sala de cinema, em cima de uma das imagens mais tristes da carreira de Pelé no momento em que saia lesionado após ter levado uma valente cacetada do Morais, o locutor de serviço disse: "Rei morto, Rei posto e o novo Rei se chama Eusébio..."
Enganaram-se...
O pobre Eusébio nunca mais ganhou nada na vida, e o Pelé ainda haveria de ser campeão mundial quatro anos depois, no México.
Mas não se preocupe, Seve...
Sammy sabe muito bem a que ressentimentos me refiro... :)
Cumprimentos,
LM

Seve disse...

Ó meu caro LM e nesse mundial do México o Pelé foi absolutamente soberbo, era eu muito criança mas nunca mais esqueci aquele remate de meio campo que deixou o guarda redes da Checoslováquia (e o mundo) de boca aberta.
Pelé, Cristiano Ronaldo, Maradona e Messi são os 4 melhores jogadores da história do futebol!!!!
Abraço e SL

Seve disse...

E já agora permito-me acrescentar que a equipa do Brasil desse Mundial do México, creio que de 1970, foi a melhor equipa de futebol que vi jogar, até hoje!

Sammy, o paquete disse...

Pelas manhãs, horas variáveis, abro o computador, há um olhar pelas notícias do dia, a leitura, há longos anos, de 4/5 blogues, um deles o do Luís Eme. Hoje ele falava de Pelé. Às 12,52 horas deixei o seguinte comentário:
«11 de Outubro de 1962, ele está sentado no Estádio da Luz.
Foi a única vez que, ao vivo, viu jogar Pelé.
Para a Taça Intercontinental da época 1962/63, o Benfica perdera por 3-2, no Maracaña, e sonhou-se – a felicidade do sonho é sempre possível – que, na Luz, iríamos bater o Santos. Levámos 5 a 2 num autêntico banho de bola e três dos golos são de Pelé. Num deles ainda estou a ver um desesperado Costa Pereira a tentar, na grande área, tirar a bola a Pelé mas o homem era o que era.
Também tivemos um rei: Eusébio da Silva Ferreira. Cada um com a sua maneira de jogar - e gostaria que não entendessem a questão agarrada a qualquer ponta de patriotismo - mas gostava mesmo era desse tal Eusébio. O gesto, a alegria com que festejava o golo era um espectáculo dentro do próprio espectáculo.
Coloquem-se os reis de parte, falemos antes de grandes jogadores de futebol, que realmente, Pelé e Eusébio, foram.»
Acreditem ou não, só mais tarde cheguei aqui. Para agradável espanto perceber que um poema do Mark Strand, um lindíssimo poema, diga-se, eu que não conheço a sua obra, apenas a leitura avulsa de alguns poemas, ter provocado um trocar de impressões sobre Pelé.
Ainda não tinha pensado no que colocar aqui sobre a morte de Pelé. E não estou a ver, assim de repente, no que LM diz ao viajante SEVE, ser o meu ressentimento por nada ter aparecido.