Joaquim Vieira – histórias antigas - não gosta de José Saramago, mas acenaram-lhe (Novembro de 2018) para escrever um livro sobre o autor e não hesitou.
Chama-se o livro «José Saramago: Rota de Vida».
No livro existem largas páginas
dedicadas ao facto de José Saramago gostar de mulheres. Há mesmo um capítulo, o
6º, com as suas 30 páginas, que Vieira não resistiu à tentação de titular:
«O Pinga-Amor».
Se quiséssemos seguir a
maledicência de Joaquim Vieira, e de
quem, sobre as mulheres de Saramago pensa os mesmos disparates que Vieira, poderíamos
ir à infância/adolescência de Saramago para ficarmos a saber como,
provavelmente, tudo começou.
O sublinhado de hoje está
na página 42 de As Pequenas Memórias:
«Quanto à
Domitília, fomos apanhados, um dia Quanto à Domitília, fomos apanhados, um dia,
ela e eu, metidos na mesma cama, a brincar ao que brincam os noivos, activos,
curiosos de tudo quanto no corpo existe para ser tocado, penetrado e remexido.
Pergunto-me que idade teria nessa altura e creio que andaria pelos onze anos ou
talvez um pouco menos (na verdade, é-me impossível precisar, pois morámos por
duas vezes na Rua Carrilho Videira, na mesma casa). Os atrevidos (vá lá a
saber-se qual de nós teve a ideia, ainda que o mais certo é que a iniciativa
tenha partido de mim) apanharam umas palmadas no rabo, creio recordar que
bastante pró-forma, sem demasia da força. Não duvido de que as três mulheres da
casa, incluindo a minha mãe, se tivessem rido depois umas com as outras, às
escondidas dos precoces pecadores que não tinham podido aguentar a longa espera
do tempo próprio para tão íntimos descobrimentos. Lembro-me de estar na varanda
das traseiras (um quinto andar altíssimo), de cócoras, com a cara metida entre
os ferros, a chorar, enquanto a Domitília, na outra ponta, me acompanhava nas
lágrimas. Mas não nos ficou de emenda. Uns anos depois, já eu morava no número
11 da Rua Padre Sena Freitas, ela foi visitar a tia Conceição, e o caso é que
não havia ali tia nem tio, nem meus pais estavam em casa, graças ao que tivemos
tempo de sobra para acercamentos e investigações que, embora não chegando a
vias de facto, deixaram inapagáveis lembranças a um e a outro, ou pelo menos a
mim, que ainda daqui a estou a ver, nua da cintura para baixo.»
Legenda: imagem colorida por Aida Santos
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