Não podemos ser destrutivos ao ponto de dizer que a «Revista» do Expresso não tem ponta por onde se lhe pegue.
Há por lá uma secção «Planetário – No Caminho das
Estrelas» da responsabilidade de João Pacheco, filho do poeta Fernando Assis
Pacheco que morreu, prematuramente, à porta da Livraria Bucholz.
Numa das suas últimas colunas, João Pacheco disserta
sobre Movimentos Improváveis:
«O prato do dia era
ensopado de borrego à moda de Borba. Mas o que estava em causa naquela jogada
arriscada era uma garrafa de Porto de 1952. A aposta fora feita à volta da mesa
de bilhar opondo o maître da Casa do Alentejo ao narrador do livro “Requiem”.»
Regressei ao livro e
apanho estas palavras:
«Aparentemente estou
lixado, mas não me vou dar por vencido, é proibido o macê? O macê não, disse
com ironia o Maitre da Casa do Alentejo, mas se o senhor rasgar o pano terá que
pagá-lo. Está bem, disse eu, então acho que vou tentar um macê.»
Na Rua dos Anjos, em
Lisboa, quase a cortar para a Almirante Reis, com o antigo Cinema Lyz na outra esquina, havia um café formidável: o
«Ribatejano».
Café, restaurante, sala de jogos, do lado direito que tem entrava, venda de jornais, revistas e tabacos, engraxador por entre as mesas, um belo balcão.
O antigo Café Ribatejano, o café e o restaurante, a sala de jogos.
O café há muito que fechou
portas e no seu lugar ainda está a Nortel – Utensílios e Equipamentos para Hotéis e Restaurantes.
Tantas horas que
passei naquele café, a ler o Diário de Lisboa, um qualquer livro, o café era de
«saco», tinha uma pastelaria fina e uns excelentes pastéis de bacalhau.
Acabada a leitura,
rumava para a sala de jogos: damas, xadrez, bilhares, a três tabelas e snooker.
Na parede o aviso: «É
proibido o macê».
O mesmo aviso existia na
sala de jogos, no primeiro andar da Cervejaria Portugália.
Nunca tive
habilidades para o bilhar, limitava-me a ver e gostava disso, pricipalmente o snooker.
Ainda o Requiem do
Tabucchi:
«O Maitre da Casa do
Alentejo tapou a garrafa e disse: o que fica é para quem ganhar, acho que
chegou a altura de o senhor experimentar o seu macê.
Levantámo-nos e eu
senti que tinha as peernas pouco seguras, pensei que naquelas condições era uma
milagre se conseguisse acertar na bola, mesmo assim peguei no meu taco, passei
o giz na ponta e fui até à beira da mesa de bilhar. Pus-me na ponta dos pés
para atingir a bola de cima. A minha mão tremia ligeiramente, teria de precisar
de um apoio, mas o macê joga-se sem apoio, de cima para baixo.»
João Pacheco, para
ilustrar o texto, escolheu «Grande Masse», de 1933 do artista japonês NakagawaIsaku e adianta sobre o macê:
«O objectivo do
jogador é picar a bola, mas esse malabarismo é muito arriscado, até para a
saúde do panoi verde da mesa de bilhar. É também esse truque de bilharista que
esta jogadora está atentar na gravura “Grand Masse”»
Por macê não poderia
deixar de trazer aqui a loucura mansa de Alexandre O’Neill com o seu «É Proibido o Macê», que faz parte de «As Andorinhas Não Têm Restaurante», nº 7 da Colecção Cadernos de Literatura, publicado em 1970 pelas Publicações Dom Quixote, livro que levou sumiço da
Biblioteca da Casa:
Ao passar pelo Vicente, Datuatia traqueja e diz para a velha das
castanhas «troque-me este em miúdos!» e ri-se como um selvagem. A tiazinha
fica-se a dar ao abano, como que a espalhar o petisco com que Datuatia a
mimoseara. «Que vá gozar a patusca da mãe dele» diz a tiazinha de mistura com
outras gentilezas de fazer corar o mais conspícuo, mas já Datuatia virara a
esquina na bruta gáspea.
Em menos duma loja de barbeiro, Datuatia chega aos Bilhares, atira o cabedal para uma cadeira, põe a pata em cima do verde e declara que dá quinze às cinquenta a qualquer dos èpás que por ali se coçavam. «Prajá» disse um deles. Chamaram o Rentàterra, que em três trrrins tirou as bolas, depositou-as em cima do verde e preveniu pela estafadésima vez os èpás que era proibido o macê.»
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