Só em caso de extrema necessidade recorro ao Pingo Doce das Olaias.
Antigo que sou, prefiro o comércio tradicional e pelo bairro ainda vou
tendo uma drogaria, um café dos antigos, com uma esplanada extraordinária onde, no tempo da bica e do bagacinho, se discute tudo, desde plítica ao futebol e muito má língua, e o Chiva simpático comerciante
napalês, para frutas, legumes e o que quer que esteja a faltar para completar o
almoço.
O Pingo Doce, até Junho do passado ano, viu os lucros cresceram para 261 milhões de euros
e pagam os impostos em paraísos fiscais. O país que se lixe! Os lucros da Galp,
mais ou menos no mesmo período saltaram para 608 milhões de euros e à volta
disto o governo de António Costa continua a ter imensas dificuldades em
construir uma lei que taxe os lucros excessivos das grandes empresas.
Mas no tal Pingo Doce das Olaiais nem todas as caixas estão abertas,
procura-se um assistente para se saber onde posso encontrar algo que os olhos
não encontram no imediato e não se vê
nenhum, para além de pagarem
miseravelmente aos trabalhadores e imporem horários de autêntica escravatura.
Num tempo em que estava no Pingo Doce, frente à peixaria, a aguardar
vez para que me cortassem bacalhau, ao
lado uma estantezeca de livros, fui olhando os títulos e chamou-me a atenção CampoDe Bargos, o futebol ou a recuperaçãoda infância.
O autor, nascido junto ao campo de futebol, conta a história dos seus
domingos no Campo dos Bargos. Memórias futeboleiras da infância, as minhas começaram no Campo Grande, a velha estância de madeira onde ia com o meu avô ver os
jogos do Benfica, tudo muito longe do que o futebol, infelizmente, hoje é.
Um livro muito curioso, interessante mesmo. Não deixem de o ler.
Deixo-vos estas passagens:
«O professor Reis-Sá morreu nos meus 17 anos. Por isso, as melhores
memórias que tenho do meu pai são as que ficaram por acontecer. Ainda há muitas
antes, serei justo. Mas todas elas perspectivavam mais. E o tempo não deixou
que acontecessem. A ficção é a melhor memória que existe.»
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