Lembro-me bem dos Mercados de brinquedos no Martim Moniz e no Largo de Camões. A velha fotografia que no cimo se publica, pertence a uma das barracas onde se vendiam brinquedos no Largo de Camões. Não tem referência do ano. Talvez anos 50.
Nela se vêem os tambores
que o pai em miúdo quis ter e que nunca lhe deram. Ao ponto de no meu primeiro
Natal ter posto à volta da árvores de Natal, dezenas e dezenas de tambores.
Tal como se recorda nesta
história já por aqui publicada:
«No Natal de 2012 comprou o Diário de Inverno de
Paul Auster.
Qualquer pretexto lhe serve para comprar um livro.
Não sendo autor referencial da casa, bastou-lhe ler na contracapa:
«Pensas que nunca te vai acontecer, que não te pode acontecer, que és a
única pessoa no mundo a quem essas coisas nunca irão acontecer, uma a uma,
todas elas começam a acontecer-te, como acontecem a toda a gente.»
Gostou do livro.
Mais ainda, quando quase a findar, leu:
«Conversando com o teu pai em sonhos. Há muitos anos que ele te visita num
quarto escuro do outro lado da consciência, sentando-se a uma mesa contigo para
conversas longas e sem pressas, calmo e circunspecto, tratando-te sempre com
amabilidade e bonomia, escutando sempre com atenção o que lhe dizes, mas,
quando o sonho acaba e tu acordas, não te lembras de uma única palavra do que
cada um de vocês disse».
Sininhos de Natal tremelicaram. Também a ele o pai o visita. E lembrou-se, que
por aí, tinha um qualquer registo que, voltas e mais voltas, acabou por
encontrar.
Há espelhos que se aproximam de nós e trazem-nos as pessoas que somos.
Lembra-se dos tambores que o pai lhe deu no primeiro Natal?
Não, não se pode lembrar, mas é como se assim fosse.Contaram-lhe a história e ele consegue ver.
O pai deu-lhe uma mão cheia de tambores, aqueles tambores de madeira com riscas vermelhas, pele de cartão, dois pauzinhos, os tambores, tambores que o pai quisera um dia ter na sua infância e que nunca lhe deram.
Há espelhos que vêm até nós com as imagens nunca vistas, mas que outros contaram.
E passam a ser nossas.
Pendurado nos livros, colocou o último boné que o pai usou, o seu ouvinte mais inteligente.
Tem dias, mas principalmente noites, que sente que o pai anda por aqui, aquele cheiro a tabaco negro, marca UNIC, cigarros que o ajudaram a viver e acabaram
por lhe trazer o último suspiro.
Uma voz: Então não há por aí um whisquinho e logo a seguir: já
agora põe aí a Peggy Lee a cantar o «Johnny Guitar.
Play the guitar, play it again, my Johnny, maybe you're cold, but you're so
warm inside.
Comove-se cada vez que olha o boné e disso fez um hábito.
Ouvem-se tambores ao longe.
E é quase Natal!»
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