Eu caminhei na noite
Entre silêncio e
frio
Só uma estrela
secreta me guiava.
Grandes perigos na
noite me apareceram
Da minha estrela
julguei que eu a julgara
Verdadeira sendo
ela só reflexo
De uma cidade a
néon enfeitada.
A minha solidão me
pareceu coroa
Sinal de perfeição
em minha fronte
Mas vi quando no
vento me humilhava
Que a coroa que eu
levava era de um ferro
Tão pesado que toda
me dobrava.
Do frio das montanhas
eu pensei
"Minha pureza
me cerca e me rodeia"
Porém meu
pensamento apodreceu
E a pureza das
coisas cintilava
E eu vi que a
limpidez não era eu.
E a fraqueza da
carne e a miragem do espírito
Em monstruosa voz
se transformaram
Disse às pedras do
monte que falassem
Mas elas como
pedras se calaram
Sozinha me vi
delirante e perdida
E uma estrela
serena me espantava.
E eu caminhei na
noite minha sombra
De desmedidos
gestos me cercava
Silêncio e medo
Nos confins
desolados caminhavam
Então eu vi chegar
ao meu encontro
Aqueles que uma
estrela iluminava.
E assim eles
disseram: "Vem connosco
Se também vens
seguindo aquela estrela"
Então soube que a
estrela que eu seguia
Era real e não
imaginada.
Grandes noites
redondas nos cercaram
Grandes brumas
miragens nos mostraram
Grandes silêncios
de ecos vagabundos
Em direcções
distantes nos chamaram
E a sombra dos três
homens sobre a terra
Ao lado dos meus
passos caminhava
E eu espantada vi
que aquela estrela
Para a cidade dos
homens nos guiava.
E a estrela do céu
parou em cima
de uma rua sem cor
e sem beleza
Onde a luz tinha a
cor que tem a cinza
Longe do verde azul
da natureza.
Ali não vi as
coisas que eu amava
Nem o brilho do sol
nem o da água.
Ao lado do hospital
e da prisão
Entre o agiota e o
templo profanado
Onde a rua é mais
triste e mais sozinha
E onde tudo parece
abandonado
Um lugar pela
estrela foi marcado.
Nesse lugar pensei:
"Quanto deserto
Atravessei para
encontrar aquilo
Que morava entre os
homens e tão perto.
Sophia de Mello Breyner Andresen em Natal... Natais
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