domingo, 24 de dezembro de 2023

VELHOS RECORTES


 

O Natal não tem apenas o seu lado brilhante. 

Há um pedaço de rua onde reinam as sombras e a solidão. 

Há uma frase de Maria Judite de Carvalho no seu livro de contos «Tanta Gente, Mariana»: «Todos estamos sozinhos, Mariana. Sozinhos e muita gente à nossa volta, tanta gente Mariana, e ninguém vai fazer nada por nós.»

Está sempre a ouvir que as pessoas se habituam a tudo, só não se habituam à solidão. Uma canção de Brel, deixa-me ser a sombra da tua sombra, a sombra da tua mão, a sombra do teu cão, mas não me deixes.

Um amigo dizia-lhe que antigamente chorava, agora chora pouco e, por isso, a solidão tornava-se mais incompleta. Arrastava-se tentando administrar a sua solidão. São muitos e não imaginamos. A solidão não pára de crescer.

Notícias de desesperos, notícias de suicídios. 

O recorte é do  Diário de Lisboa” de 27 de Dezembro de 1976 e a notícia é proveniente do Porto:

“António Manuel, de 14 anos, no dia de Natal, lançou-se de uma janela do Coliseu do Porto, tendo sido conduzido ao Hospital de Santo António sem fala e com várias fracturas.
O jovem, que é natural do lugar de Idanha, encontra-se numa fase de recuperação, tendo começado já a articular algumas palavras”
O jornalista fechava assim a notícia:
“De acordo com estatísticas mundiais, a quadra do Natal regista sempre uma subida de tentativas de suicídio, que alguns psicólogos identificam com uma maior acuidade em relação à solidão em dias que a maioria das pessoas se reúne para confraternizar.”.

Legenda: fotografia do Museu do Neo-Realismo.

1 comentário:

Seve disse...

A solidão aumenta na proporção em que a ânsia e a ambição (do dinheiro) são o motor deste estranho mundo que não olha a meios para atingir os fins.