Este anúncio foi publicado no Diário de Notícias de 30 de Março de
2002.
Hoje, o mundo do pequeno anúncio é, completamente, diferente: apelam a call
girls, a carl boys, a massagens a isto, aquilo e aqueloutro.
Um tempo houve que os anúncios, principalmente os do Diário de Notícias revelavam pessoas à procura de outras para convívio,
para refazerem uma vida, pessoas invadidas por uma solidão, a que,
desesperadamente, queriam fugir.
«Sou divorciada, 36 anos e dois filhos.
Procuro companheiro livre, formado e culto para juntos construirmos a
felicidade a que temos direito».
«Separado, 48 anos, grande solidão, posição estável, pretende senhora para convívio».
Fugir à solidão, tentar, ainda, uma gota de felicidade, por vezes nem
felicidade é, apenas um aconchego…
Que faz correr esta gente cansada? Donde vem esta gente tão só? Que sabemos nós? Que desígnios, situações, circunstâncias os levaram até aqui?
O vazio. A lucidez deste hábito. Nascer é inaugurar a solidão. Será?
Há prédios no centro de Lisboa onde apenas vive um idoso, o resto são
escritórios.
Quando a pessoa se dá conta que está sozinha vai para o hospital. Não diz que está sozinho, diz que está doente. Os serviços hospitalares têm destes casos todos os dias.
E estes são os que ainda podem sair de casa. Outros… bom... outros...
Quantos milhares de idosos vivem sozinhos em Lisboa? E ali? E acolá?
Em 2023 estimavam-se 575 mil idosos a viver sozinhos.
Saber administrar a solidão…
Perguntaram a um pastor se ele não se aborrecia de estar ali, dias e dias, com as ovelhas e mais nada.
«Não, não me aborreço porque as ovelhas às vezes bolem…»
A solidão que não pára de crescer…
Não me deixes
Oferecer-te-ei
Pérolas de chuva
Vindas de países
Onde nunca chove
Não me deixes
Deixa-me ser
A sombra da tua sombra
A sombra da tua mão
A sombra do teu cão
Não me deixes…»
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