Começo de Os Cus De Judas
de António Lobo Antunes:
«Do que eu gostava mais no Jardim Zoológico era do
ringue de patinagem sob as árvores e do professor preto muito direito a
deslizar para trás no cimento em elipses vagarosas sem mover um músculo sequer,
rodeado de meninas de saias curtas e botas brancas, que, se falassem, possuíam
seguramente vozes tão de gaze como as que nos aeroportos anunciam a partida dos
aviões, sílabas de algodão que se dissolvem nos ouvidos à maneira de fins de
rebuçado na concha da língua.»
Um começo de livro que coloco no número dos meus
preferidos.
É uma imagem que transporto dos meus distantes tempos de
menino e quando a li expressa pela prosa de António Lobo Antunes, comovi-me.
Já por diversas vezes aqui expressei a ideia de que os recentes
romances de António Lobo Antunes tornaram-se-me de difícil leitura, por vezes,
mesmo incompreensível.
De um só fôlego li Memória de Elefante, Os Cus de
Judas, Explicação dos Pássaros e disse para comigo que tinha ali um autor
para a vida.
Acontece até que os títulos que Lobo Antunes arranja para
os seus romances, são uns excelentes achados. Mas já são livros que não li, ou
deixei-os nas primeiras 50 páginas, que é a medida que coloquei a mim mesmo
para que um livro me leve até ao fim.
Exemplos:
Não Entres Tão Depressa Nessa Noite Escura,
Que farei quando tudo arde?,
Boa Tarde às Coisas Aqui em Baixo,
Que Cavalos São Aqueles Que Fazem Sombra no Mar?,
Não É Meia Noite Quem Quer,
Caminho Como Uma Casa Em Chamas,
Para Aquela que Está Sentada no Escuro à Minha
Espera
Até Que as Pedras Se Tornem Mais Leves Que a Água
A Última Porta antes da Noite.
Sou, pois, um desistente leitor de António Lobo Antunes.
Hélas!
Já nem as crónicas, que sempre gostei de ler, o autor deixou
de as escrever para os jornais e revistas que antes as publicavam. A editora
que o suporta consentiu na patetice do autor, ou teve receios, dado o seu
conhecido mau feitio, que saísse porta fora a caminho sabe-se lá de quê.
Legenda: contra capa da 1ª edição de Os Cus deJudas.
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