terça-feira, 13 de setembro de 2011

POSTAIS EM SELO


"O automóvel, uma caranguejola coberta de lama, rolava pela estrada e veio parar, de repente, junto da magnólia. O homem alto e magrizela, que parecia ter vivido no racionamento desde o dia em que deixara o peito materno, estava sentado, lúgubre e imóvel, de mãos agarradas ao volante. Os seus olhos fixavam a linha descaída dos vedados em frente.
Clary Horey inclinou-se para diante no seu cadeirão, na varanda, franzindo os olhos para atenuar a reverberação faiscante do Sol na brancura da areia, e procurou ver quem chegara. Por um momento não conseguiu convencer-se de que tinha visto alguém.
Ali sentado, na varanda, a olhar, semana após semana, ano atrás de ano, para aquela terra seca e sem cor, habituara-se a duvidar, às vezes, dos seus próprios olhos.
- O diabo da chicória enfraquece a vista à gente no Verão -- murmurou --. - Um dia destes tenho de passar a tomar um prata de cereal. Parece que não há nada já que aguente um homem acordado.
De olhos cerrados, Clay procurava ouvir, através do calor estridente, o alvoroço causado pela chegada daquele estranho. Podia reconhecer o papear dum gaio e o relhar agudo de um arado, e todos os outros sons familiares que lhe chegavam de léguas em redor das rochas areentas, mas era-lhe difícil distinguir sons estranhos ao seu próprio quinteiro.
- Não pode ser nenhum tipo de importância -- disse, por fim, abrindo bem os olhos. - Se é, desviou-se, com certeza, do caminho para vir aqui parar.
Clay continuava a olhar para o homem lúgubre, no carro descoberto, meneando a cabeça numa grande confusão. Não podia imaginar que houvesse alguém, no mundo inteiro, que viesse naquela direcção e àquela hora do dia para o ver. Não tinha dinheiro para comprar fosse o que fosse, nem mesmo para pagar o que devia; era verdadeiramente uma perda de tempo para alguém dar-se ao incómodo de vir de tão longe para o visitar."

Erskine Caldwell em “O Pregador”

Legenda: Fotografia tirada do Shorpy Photos Archive

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