Aqui eram Os Anarquistas.
Quando a fotografia foi tirada, talvez há um ano,
estava lá uma chic-boutique-chic que, com a rapidez com que estas lojas abrem e
fecham na baixa lisboeta, talvez já tenha fechado e esteja por lá uma outra
coisa qualquer.
Quando saíamos do Juvenil, o Armindo, o Zé, o Hélder Pinho, o poiso para continuar
converseta recaía num dos muitos tascos
que, então, existiam no Bairro Alto. Mas onde, com mais assiduidade, íamos era Os Anarquistas
(que nome admirável para um tasco!), no
Largo Da Trindade, em frente da porta dos artistas do Teatro da Trindade, e que
mais não é que uma rua a que, por motivos que desconheço, chamam largo.
Ao lado O Mundo do Livro, mapas
e livros antigos, ainda de portas aberta, no topo da rua, a velha Barateira
que não é mais é um dos bons alfarrabistas de Lisboa.
O tasco era uma casa pequena, sem luzes florescentes,
marido e mulher galegos, ela na cozinha, como é importante que aconteça para
que a comida tivesse aquele toque único de saber a comida.
As doses vinham em travessas que não eram deixadas
na mesa para nos servirmos. O galego fazia descarga directa no prato e ganhava
o tempo de as ir lavando.
Amiúde por ali podíamos encontrar escritores, jornalistas,
gente das artes e afins.
Dos ambientes mais castiços e gratificantes que guardo
daqueles juvenis tempos, século passado, uma ditadura para deitar abaixo, não
se sabia bem como, mas esperanças a fervilharem e inventavam-se detalhes.
Deste velho tasco não há grandes, nem pequenas,
referências.
Apenas tenho esta, que o José-Augusto França deixou mas
suas Memórias para o Ano 2000:
Nestes
anos de 40 para 50 do meu testemunho, os que vinham ao fim da manhã como ao fim
da tarde, quando do Bairro Alto das redacções vinham também os jornalistas. Que
aliás se encontravam a almoçar na esquina de cima, que era a dos «Anarquistas»,
com as suas mesas de mármores encardido, seus mochos de cozinha e seus galegos
simpáticos, dois sócios e empregados afins «lá de xima», que juntaram tostão a
tostão até à bem merecida reforma, que a comida era boa e barata. Os
«Anarquistas» eram uma espécie de desinência da «Brasileira», até aos anos 70
de seus fins, que foi fim de muita coisa local. Ali, nos últimos meses de 1956,
o Ruben A. Conseguiu, durante ano e meio, reunir todas as quartas-feiras para
jantar económico, os mais variados nomes e pessoas, do Almada ao casais, do
Sena ao Pedro, da Merícia e Isabel ao Gaspar Simões (com quem fiz as pazes…)
dali se partindo, já perto da meia-noite, com os patrões galegos cabeceando de
sono, para casa de uns e de outros, em serões prolongados à moda antiga, muito
menos intelectuais do que podia parecer, em tempo simpaticamente perdido em
cavaqueira e até jogos de sala. Eram as «quartadas»… Bem obra do Rubinho,
mundano e fantasista, autor de notáveis «Páginas» de diário e duma portentosa
«Torre de Barbela».
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