«Quando o senhor, também conhecido como deus, se
apercebeu de que a Adão e Eva, perfeitos em tudo o que apresentavam à vista,
não lhes saía uma palavra da boca nem emitiam ao menos um simples som primário
que fosse, teve de ficar irritado consigo mesmo, uma vez que não havia mais
ninguém no jardim do éden, a quem pudesse responsabilizar pela gravíssima
falta, quando os outro animais, produtos, todos eles, tal como os dois humanos,
do faça-se divino, uns por meio de mugidos e rugidos, outros por roncos,
chilreios, assobios e cacarejos, desfrutavam já de voz própria. Num acesso de
ira, surpreendente em quem tudo poderia ter solucionado com outro rápido fiat,
correu para o casal e, um após outro, sem contemplações, sem meias-medidas,
enfiou-lhes a língua pela garganta abaixo.»
José Saramago em
Caim
José Saramago nunca escondeu, e sempre foi dizendo, «que a Bíblia tem umas quantas histórias mal contadas.»
E ainda:
«O que merece crítica pode contar com a minha pessoa.»
Rui Zink
escreveu um dia que a «religião é uma coisa demasiado séria para ficar só
entregue a especialistas.»
Outra vez Saramago:
«O teólogo Hans Kung disse uma frase que considero
definitiva, que as religiões nunca serviram para aproximar os seres humanos uns
dos outros.»
Legenda: capa de Caim
publicado pela Porto Editora. A caligrafia da capa é da autoria de Clara
Ferreira Alves.
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