sábado, 10 de novembro de 2018

SARAMAGUEANDO


«Quando o senhor, também conhecido como deus, se apercebeu de que a Adão e Eva, perfeitos em tudo o que apresentavam à vista, não lhes saía uma palavra da boca nem emitiam ao menos um simples som primário que fosse, teve de ficar irritado consigo mesmo, uma vez que não havia mais ninguém no jardim do éden, a quem pudesse responsabilizar pela gravíssima falta, quando os outro animais, produtos, todos eles, tal como os dois humanos, do faça-se divino, uns por meio de mugidos e rugidos, outros por roncos, chilreios, assobios e cacarejos, desfrutavam já de voz própria. Num acesso de ira, surpreendente em quem tudo poderia ter solucionado com outro rápido fiat, correu para o casal e, um após outro, sem contemplações, sem meias-medidas, enfiou-lhes a língua pela garganta abaixo.»

José Saramago em Caim

José Saramago nunca escondeu, e sempre foi dizendo, «que a Bíblia tem umas quantas histórias mal contadas.»

E ainda:

«O que merece crítica pode contar com a minha pessoa.»

Rui Zink escreveu um dia que a «religião é uma coisa demasiado séria para ficar só entregue a especialistas.»

Outra vez Saramago:

«O teólogo Hans Kung disse uma frase que considero definitiva, que as religiões nunca serviram para aproximar os seres humanos uns dos outros.»

Legenda: capa de Caim publicado pela Porto Editora. A caligrafia da capa é da autoria de Clara Ferreira Alves.

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