sexta-feira, 9 de novembro de 2018

SARAMAGUEANDO

«Como já deveríamos saber, a representação mais exacta, mais precisa, da alma humana é o labirinto. Com ela tudo é possível.»

José Saramago em A Viagem do Elefante

Segundo António Mega Ferreira, A Viagem do Elefante é, pura e simplesmente, literatura. E é excelente.»

O livro narra uma viagem de um elefante que estava em Lisboa, e que tinha vindo da Índia, um elefante asiático que foi oferecido pelo nosso rei D. João III ao arquiduque da Áustria Maximiliano II (seu primo). Isto passa-se tudo no século XVI. O elefante tem de fazer essa caminhada, desde Lisboa até Viena, e o que o livro conta é essa viagem. Percorreu milhares de quilómetros e morreu um ou dois anos depois da chegada.

A epígrafe do livro é: «sempre chegamos ao sítio aonde nos esperam.»

E quem nos espera?

«A causa da morte não chegou a ser conhecida, ainda não era tempo de análises de sangue, radiografias do tórax, endoscopias, ressonâncias magnéticas e outras observações que hoje são o pão nosso de cada dia para os humanos, não tanto para os animais, que simplesmente morrem sem uma enfermeira que lhes ponha a mão na testa. Além de o terem esfolado, a salomão cortaram-lhe as partes dianteiras para que, após as necessárias operações de limpeza e curtimento, servissem de recipientes, à entrada do palácio, para depositar as bengalas, os bastões, os guarda-chuvas e as sombrinhas de verão.»

Uma maneira humilhante de morrer.

 Aquelas grossas patas que andaram quilómetros e quilómetros são transformadas em objectos para colocar guarda-chuvas, outras coisas.

Muitas páginas antes, José Saramago descrevera:

«Ensinado, o que se chama ensinado, no sentido de saber mais umas quantas habilitações de circo, não o é, mas costuma comportar-se com a dignidade de um elefante que se respeita.»

Legenda: capa de A Viagem do Elefante publicado pela Porto Editora. A caligrafia da capa é da autoria do escritor Mário de Carvalho.

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