terça-feira, 20 de maio de 2014

QUOTIDIANOS


Não estive lá, mas sou Benfica desde o longínquo domingo, com7/8 anos, quando passei a ir ao futebol com o meu avô, ainda na velha Estância de Madeira no Campo Grande.

Mas sei pelo que me disseram, pelo que as televisões interminavelmente mostraram, duma Praça do Município completamente cheia, as gentes a extravasarem para as ruas circundantes.

Bandeiras desfraldadas, cartazes pintados à mão, uma grande fotografia do Eusébio, cânticos, vivas, algures estariam as roulotes com bifanas, sandes de coirato, cervejas.

Um entusiasmo legítimo, tão natural como a água que se bebe quando temos sede.

Mas na Praça do Município estive, 13 de Outubro de 1998, quando José Saramago, Prémio Nobel da Literatura, assomou àquela mesma janela para um aceno de agradecimento, àqueles que preenchiam menos de meia Praça mas que lhe quiseram dizer obrigado pelos livros, as palavras, os gestos com que nos ajuda a preencher os dias.

O que faz correr as gentes, estas gentes tão sós?


O dia em que enchermos uma qualquer praça para saudar a cultura como a enchemos para saudar o futebol, aí podemos dizer que somos um país, um país em que dá gosto viver por sabermos, então, o que por aqui andamos a fazer.

Que se deixou cair que o Benfica tenha apanhado do chão?, perguntava, em Abril de 1972, Artur Portela Filho.

Apeteceu-me, em final de crónica, deixar palavras do José Gomes Ferreira, mais por esperança do que por tristeza ou desespero:

Que bom! continuar a embalar medrosamente sonhos, considerando-os irrealizáveis, difíceis e impossíveis, apesar de estarmos tão próximos… tão próximos do futuro que bastaria um passo… um passo apenas… sem abismos… nem riscos… Somente um passo
(Eu sou pelo passo.)

Legenda: imagens, respectivamente, de A bola e do Público.

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