O melhor dum escritor é ser negociável no entendimento,
comum no conviver, justo no aconselhar, benigno no julgar e sempre aberto
perante as glórias. É soberba esperar muito do que se faz por talento, porque
se faz com gosto. E um gosto não é medida do trabalho humano. Este é,
sobretudo, esforço e sacrifício e passo do destino que nos acabrunha. O
escritor é hoje um modelo de ignorância, e não um trajecto de sabedoria, Mesmo
quando se faz erudito, converte-se num mercado de bugigangas, com muitas coisas
brilhantes que apregoar e poucas valiosas para oferecer. Também não é bom ser
austero demais, nem culto, que pareça solidão fingida. Bom, é agradecer a luz
do coração com que se fazem amigos. Bom é amar em pequenas porções, momentos,
pessoas e tudo que não faz costume. Arregaço as mangas, não para escrever um
livro, mas para me acotovelar com a multidão. Oh gente tão lenta em perceber
que a amamos! É crueldade dar aos livros o tempo com que nascemos. Construir a
natureza é o que nos faz calcular a sua vastidão
Agustina Bessa Luís em Caderno de Significados
Sem comentários:
Enviar um comentário