É verdade que cinco minutos de alguns tipos valem 50
anos de outros tipos e que a sua explosão numa nova e brilhante estrela atira
as vendas de discos para a estratosfera, fazendo com que vivam depressa e
morram cedo, deixando como legado um cadáver bonito. Mas eu acho que precisamos
de exaltar o próprio ato de viver. Pessoalmente, prefiro que os meus deuses
fiquem velhos, grisalhos e cá.
Prefiro ter o Bob Dylan, o festim de piratas saqueadores dos Stones, a pujança
espero-ficar-muito-velho-antes-de-morrer dos atuais Who, um Brando gordo mas
hipnótico até à data da morte. do que a alternativa de não os ter cá. Gostaria
de ter visto o Michael Jackson a dar o seu último espetáculo, um Elvis de 70
anos a reinventar e saborear os seus talentos, as fronteiras a que o Jimi
Hendrix teria levado a guitarra elétrica e gostaria de ter visto o Keith Moon,
a Janis Joplin, o Kurt Kobain e todos os outros cujos talentos se perderam
devido a mortes precoces, mortes que roubaram tanto à minha adorada música, a
desfrutarem da bênção dos seus dons e da admiração do público. Envelhecer é
aterrador mas também fascinante e os grandes talentos transmutam-se de formas
estranhas e muitas vezes iluminadas. Além disso, só podemos desejar longa vida,
felicidade e paz a todos aqueles que nos deram tanta alegria, sabedoria e
inspiração. Há poucas pessoas assim.
A juventude e a morte sempre foram uma combinação
inebriante para os criadores de mitos que pululam pelo mundo dos vivos. E a
falta de amor-próprio, perigosa e inclusive violenta, foi desde sempre um dos
ingredientes essenciais nas fogueiras da transformação. Quando o «novo eu»
renasce das cinzas, o autocontrolo e a imprudência estão ligados de forma
imutável. Eis o que torna a vida interessante. Muitas vezes, a alta tensão
entre estas duas forças faz com que seja fascinante e divertido ver um artista,
mas também coloca uma cruz branca à beira da autoestrada, Muitos dos que
percorreram este caminho acabam por morrer ou ficar com uma exaustão grave. O
culto da morte é bastante acarinhado no mundo do rock, com direito a narrações na literatura e na música, mas na
prática não resulta em grande coisa para o cantor e a sua canção, exceto uma
boa vida que fica por viver, pessoas amadas e filhos que ficam para trás, e uma
cova funda no cemitério. O findar no auge da glória não passa de uma grande
treta.
Bruce Springsteen em Born to Run
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