terça-feira, 25 de abril de 2017

A RAPARIGA DO PAÍS DE ABRIL


Habito o sol dentro de ti
descubro a terra aprendo o mar
rio acima rio abaixo vou remando
por esse Tejo aberto no teu corpo.

E sou metade camponês metade marinheiro
apascento meus sonhos iço as velas
sobre o teu corpo que de certo modo
é um país marítimo com árvores no meio.

Tu és meu vinho. Tu és meu pão.
Guitarra e fruta. Melodia.
A mesma melodia destas noites
enlouquecidas pela brisa no País de Abril.

Começa a pátria onde começas. Verde campo
verde mar. Capital da ternura.
Tu és a lâmpada no meio desta festa
com fogueiras e povo dentro dos poemas.

Era a estranha paisagem da pobreza
o cheiro secular das coisas que apodrecem
era a canção cantada pelos bêbados
que vomitam seu fardo de viver.

E eu procurava-te nas pontes da tristeza
cantava adivinhando-te cantava
quando o País de Abril se vestia de ti
e eu perguntava atónito quem eras.

Quando vieste tudo ficou certo.
Encheram-se de trevo os campos das palavras
encheram-se de gente as mãos de cada verso
com sete estrelas sete luas nós cantámos.

E tu disseste: ergue-te e vai.
Não ouves este vento este soluço?
Ergue-te e canta uma canção para o teu povo.
Com sete barcos sete espadas nós partimos.

Raparigas sentaram-se ao redor do poema.
E então cantei de amor por ti cantei
na língua que por vezes é tão triste
a nossa língua que por vezes é assim: tão pura.

Mulher   por ti cantei. E tu me deste
um puro continente algarves de ternura.
Por ti cantei entre meu povo e meu poema
e achei   achando-te   o País de Abril.

Manuel Alegre em Praça da Canção

Legenda: ilustração de Cipriano Dourado.

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