O título do post
pertence a um poema de Jorge de Sena em 40 Anos de Servidão.
Herberto Helder
no começo de Os Passos em Volta:
Se eu quisesse, enlouquecia. Sei uma quantidade enorme
de histórias terríveis.
O que se passou
ontem com a audição de Joe Berrado na Comissão Parlamentar de Inquérito à
Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco, é inenarrável.
Um vendedor de
banha da cobra tem andado a enganar toda a gente com primeiros-ministros,
ministros, banqueiros à cabeça da lista.
Num linguajar
migrante, declarou que não tem dívidas, nem património, excepto uma garagem
particular no Funchal, e culpa os bancos por lhe terem emprestado dinheiro.
«Não sabem o que
fazem!»
Disse mais:
«Sou disléxico,
misturo nomes, números. Não sou perfeito, ainda bem. Quem foi o mais
prejudicado aqui fui eu».
Sempre me
importei com determinado tipo de coisas e nada mudou ao ponto de deixarem de me
incomodar.
Os breves
minutos em que ouvi o traste, a rir-se de todos nós, aproximou-me do limiar do
vómito, e saltei fora.
Passei pela
estante e não sei se a (des)propósito saquei este poema do Jorge de Sena:
Que adianta dizer-se que é um país de sacanas?
Todos os são, mesmo os melhores, às suas horas,
e todos estão contentes de se saberem sacanas.
Não há mesmo melhor do que uma sacanice
para poder funcionar fraternalmente
a humidade de próstata ou das glândulas lacrimais,
para além das rivalidades, invejas e mesquinharias
em que tanto se dividem e afinal se irmanam.
Dizer-se que é de heróis e santos o país,
a ver se se convencem e puxam para cima as calças?
Para quê, se toda a gente sabe que só asnos,
ingénuos e sacaneados é que foram disso?
Não, o melhor seria aguentar, fazendo que se ignora.
Mas claro que logo todos pensam que isto é o cúmulo da sacanice,
porque no país dos sacanas, ninguém pode entender
que a nobreza, a dignidade, a independência, a justiça, a bondade, etc., etc., sejam
outra coisa que não patifaria de sacanas refinados
a um ponto que os mais não são capazes de atingir.
No país dos sacanas, ser sacana e meio?
Não, que toda a gente já é pelo menos dois.
Como ser-se então nesse país? Não ser-se?
Ser ou não ser, eis a questão, dir-se-ia.
Mas isso foi no teatro, e o gajo morreu na mesma.
1 comentário:
Triste. Vergonhoso. Indigno. Como é possível que ninguém faça nada?
Se Marcelo é a voz do Povo então ó Marcelo diz qualquer coisa que o Povo sinta que é ele próprio que o diz e sente.
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