Dito
já que começaram as iniciativas que visam
registar o centenário do nascimento de José Saramago, acrescenta-se que irei
pegando num qualquer livro de José Saramago e copiarei dele uma frase, um
parágrafo, aquilo que constitui os milhares de sublinhados que, ao longo
dos muitos anos de leituras, invadiram os livros de José Saramago que habitam
a Biblioteca da Casa.
Pego hoje em A Noite, a estreia de José
Saramago como dramaturgo:
«Como pude eu escrever uma peça? Aí
está uma questão para que ainda não fui capaz de encontrar resposta e que
eventualmente a crítica repetirá, não já em todos os tons, mas naqueles só que
exprimam decepção, azedume, contrariedade vária ou ironia.»
- de uma entrevista ao semanário Sete, 16 de Maio de
1979.
José Saramago escreveu A Noite para Luzia Maria Martins, que
dirigia a Companhia Teatro Estúdio de Lisboa, sedeada no Teatro
Vasco Santana, na antiga Feira Popular, em Entrecampos.
Possivelmente, por falta de apoios financeiros, Luzia Maria Martins não
conseguiu avançar com o projecto.
Será Joaquim Benite,
com a Companhia do Teatro de Campolide, que em Junho de 1979,
no Teatro da Academia Almadense,a levará à cena.
Como primeiro sublinhado fiquemos com as palavras que José Saramago escreveu
para a contracapa do livro:
«A noite de que neste livro se fala é a de 24 para 25 de Abril de 1974. Aqui
se diz algum pouco do que aconteceu ou podia ter acontecido por trás das
janelas iluminadas das redacções e das tipografias, enquanto na rua o regime
fascista principiava a cair. Entram jornalistas de alto e baixo, tipógrafos, o
director de uns, o administrador de todos. Não há retratos, mas talvez se
encontrem retratos. Tal como na vida dos dias todos, uma gente é boa, outra
ruim, outra não sabe o que seja nem sabe o que é. Estes são firmes, aqueles são
fracos provavelmente porque nunca se lhes pediu a humana ousadia de o não
serem. Não será uma história verdadeira, mas é, com certeza, uma história sem
mentira.»
O segundo sublinhado vai para a música que
Carlos Paredes escreveu para a peça.
O terceiro sublinhado refere que o cenário
é da autoria do pintor António Alfredo.
Desse cenário escreveu Joaquim Benite;
«António Alfredo inventou um cenário que ocupava todo o teatro e que ligava
o balcão (lugar imaginário da tipografia) ao palco (a redacção), através de um
passadiço suspenso por fios de aço – lembrança dos meus tempos de “A
República”, que inspiraram, de resto, também o gabinete do director, dominando
a redacção, idêntico ao que o velho Artur Inês (quem é que se lembra dele?...)
ocupava no jornal da Rua da Misericórdia.»
Sem comentários:
Enviar um comentário