terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

LÁPIDE

                                                    a Irene Lisboa e Mário Beirão

Procuro teu rosto
nos confins da memória.

Palavras que um dia
ouvi, ou sonhei,
súbito iluminam
minha solidão.
Com elas componho
o segredo oculto
do nosso destino.
Com elas invento
e reconstituo
teu perfil de névoa,
tua voz ausente
e sempre guardada
no meu coração.
Fluis, permaneces
à flor dos dias
que correm sem nome:
O tempo desgasta
o sonho submerso
na noite, minha alma
sem luz... e a viver.
Por ínvios caminhos
me perco, à procura
de ti, que passaste
um dia, cruzando
o céu sem estrelas
nem amanhecer.

Passaste e perduras
nesse breve instante
longínquo e tão perto.
Não sei onde paira
teu perfil de névoa,
tua voz ausente,
velada, indecisa...
Mas da luz que doira
as coisas em volta
ressurges, e inundas
a vida de esperança,
ó rosto impalpável,
ó voz pressentida
lá no mais secreto
da alma, do ser.

 

Luís Amaro de Artes e Letras, Diário de Notícias 9 de Abril de 1970 em Poesia 70

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