Hoje arrumei a estante.
Livros
empilhados há anos pelos cantos
alojando pequenos animais no rés-do-chão
imensas caves larvares de encontro aos tacos
aqui
e ali um fio de teia
mas
nunca a aranha
não
gostam de ler.
Um
a um
limpo
a lombada
folheio
miro
de relance o índice. Este é para aqui!
Coloco-o
no lugar exato da prateleira
espaço
reservado à eternidade
os outros aguardam
fitam-me com seus olhos pétreos
os mais velhos largando odores
a pó de arroz
a pó
a pétalas amortalhadas
a invernos chuvosos
lumes de lareiras e o ruído da página que se vira.
Aguardam
com olhos pétreos
suspensos
da decisão
o
pensamento universal ficou na prateleira de cima
escorre
água pelas vidraças
os manifestos revolucionários logo ao lado
esquerdo nos seus vermelhos fulgentes
na de baixo uma coleção de bichos da national geographic
dorsos em couro tartaruga
as
biografias olham-me estarrecidas.
Tantos anos para isto?
Perguntam
as
biografias dos que tombaram
para
que houvesse amanhã
tombaram
mas agora os levanto
entalando-os
com uma jarra
para
não escorregarem
agora
sim, arrumei a revolução.
Recomponho
o lume
que
soçobrava nas próprias cinzas
e
logo um labareda recomeça
Nota do Editor: este poema de Nota do Editor: este poema de João Habitualmente foi copiado do jornal Público, 10 de Abril de 2024
Poesia Pública é uma iniciativa do Museu e Bibliotecas do Porto comissariada por Jorge Sobrado e José A. Bragança de Miranda. Ao longo de 50 dias publicaremos 50 poemas de 50 autores sobre revolução.
Sem comentários:
Enviar um comentário