Que capa de livro se olha, quando ficamos a saber que (mais) uma livraria fechou portas?
Que citação? Que palavras?
Não sei, apenas sei que a morte de uma livraria me deixa uma desesperante tristeza, uma angustia muita fina que dói.
De uma vez para sempre, devíamos ser mais – que devíamos ser TODOS, os que entendem que um livro não é uma flor de vaidade - a não comprarem livros nas fnacs, nos hipermercados.
“Exmos. Senhores
A Trama Livraria, Lda. entrou em insolvência há escassos dias. Durante os próximos tempos entrará numa espécie de período de "liquidação" que tem por objectivo escoar todos os livros que foram adquiridos (em segunda mão, maioritariamente) ao longo de mais ou menos três anos de trabalho.
Suponho que o nosso encerramento seja uma surpresa para muitos - sobretudo para aqueles que não têm aparecido mas, para dizer a verdade, estava na cara.
Como todos sabemos, nenhum negócio vive de amigos, primos, vizinhos ou entusiastas. Um negócio, qualquer que ele seja, precisa de clientes para poder cumprir com um sem fim de obrigações que passam pela renda, pelos impostos, pelas contas (água, luz, net, telefone, essas coisas) e, com sorte (não a nossa, convenhamos), pelos ordenados.
Como podem ver não fomos bem sucedidos - isto se acreditarmos nesse conceito misterioso chamado "sucesso". A meu ver - e se nos seguem há tempo suficiente bem sabem que aquilo que acho serve de pouco ou nada - fomos muito, muito bem sucedidos. Falhou o guito. Falharam várias coisas, todas passando pelo guito.
Durante três anos fizemos tudo quanto podia ser feito - concertos, leituras, conversas, edição de dois livros, teatro, festarolas, cinema, actividades infantis e sabe-se lá mais o quê. Todas estas coisas foram feitas, essencialmente, por acreditarmos que eram necessárias, pese embora nunca tenham sido lucrativas. Mas que se lixe, não estávamos nisto pelo lucro e, imaginem, nem sequer somos de esquerda. O objectivo sempre foi o mesmo, desde essa tarde de 2007 em que concebemos a Trama, até há uns meses atrás: fazer aquilo de que gostávamos e em que tínhamos alguma experiência, continuar a aprender e... partilhar. Fúria juvenil, ímpeto irracional, inexperiência, falta de jeito para o negócio, chamem-lhe o que quiserem.
Não queremos que lamentem, que tenham pena, que nos consolem. Não estamos arrependidos e, creio, fazíamos tudo outra vez. Talvez agora soubéssemos uma ou duas coisas que tornariam este desfecho diferente... mas a verdade é que se as tivéssemos sabido há mais tempo, a Trama, como a conhecem, nunca teria existido.
Não queremos que lamentem, que tenham pena, que nos consolem. Não estamos arrependidos e, creio, fazíamos tudo outra vez. Talvez agora soubéssemos uma ou duas coisas que tornariam este desfecho diferente... mas a verdade é que se as tivéssemos sabido há mais tempo, a Trama, como a conhecem, nunca teria existido.
Um erro, sim
mas belo
belo
belo
belo
Não queremos que se sintam culpados. Mas se se sentirem também não faz mal.
Até já”
Carta publicada por Catarina aqui.
Chegámos ao ponto em que não há dinheiro para coisa alguma.
Quando se chega a este ponto, começa logo por não haver dinheiro para as coisas da cultura, esse mundo supérfluo habitado por uma minoria de tresloucados.
A frieza dos números, o guito, como lhe chama a Catarina, mataram o sonho de uma vida.
Tramaram a “ Trama”!
Não gostaria, mas sinto o mesmo arrepio que o Jorge Silva Melo sentiu quando uma simpática livraria, em Campo de Ourique, fechou as portas.
Se a “Trama” fechou, fui também eu que a fechei.
E fico a desejar, uma vez mais, que as livrarias, ao contrário dos homens, possam ressuscitar.
Para já, e até final de Abril, a Trama”, ali na Rua são Filipe Folque nº 51, está em liquidações.
Legenda: Fotograma de “You Got a Mail” de Nora Ephron, com Meg Ryan e Tom Hanks, onde se conta a história de uma pequena livraria, onde havia competência e gosto pelos livros, e que é devorada por uma grande superfície, construída mesmo ao lado, também com uma livraria, mas onde campeiam a frieza, a ignorância e a incompetência.
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