terça-feira, 4 de março de 2014

ALAIN RESNAIS (1922-2014)


O primeiro olhar que tenho sobre Alain Renais é no primeiro número do Cinéfilo,  num dossier sobre filme o  Hiroxima  Meu Amor 

O filme só o veria depois do 25 de Abril

O tempo de ver os filmes de Alain Renais era um tempo que não se pode definir. Pelo menos não sei definir. Se há cineasta que me causa as mais diversas sensações, as mais diversas incompreensões, o pensar que o que estou a ver é assim e ser absolutamente o contrário, tem Resnais como mola impulsionadora. Maneira única de gostar de um cineasta e tenho poucos como ele.

Fumar ou não Fumar depois vaguear, tal como há mar e mar.

Hiroxima  Meu Amor tem por detrás um magnífico argumento, chamo-lhe livro, mas Resnais consegue dar a todo aquele trama uma envolvência com tanto de poético como de trágico.

Sabemos do horror de todas as Hiroximas da História, mas é necessário alguém com um dom especial que possa transmitir, naquele extraordinário preto e branco, todo esse horror e o que para além desse horror ainda possa estar.

Saber que nunca tinha dirigido actores e ter em mãos Emmanuelle Riva já a dizer ao que vinha, cumplicidades várias, a mão de Resnais, essa extraordinária actriz que tão recentemente vimos nesse admirável  Amour de Michael  Haneke.

Emmanuelle Riva, na entrevista ao Cinéfilo:


Hiroshima Mon Amour foi evidentemente uma experiência muito importante! Resnais ainda não tinha dirigido actores - era a sua primeira longa metragem - e ele mesmo dizia que não sabia dirigi-los. Mas havia uma grande precisão no argumento, resultado do trabalho conjunto Duras-Resnais. Toda a história do filme estava escrita com muito pormenor, muito detalhadamente, o que nos ajudou muito. Também foi um incentivo a relação de amizade que já existia entre os dois. Havia uma compreensão tácita, em meias palavras, apenas com um olhar...

Essa mão, esses dons, partiram na noite de sábado, aos 92 anos e nunca aquela frase batida de que Alain Resnais nos deixou quando ainda tinha alguns filmes na manga para nos dar,  tem tanta aplicação no momento em que se sabe da sua morte.

Um extraordinário Providence, - como é que se sai, ou se entra num castelo daqueles? - que vi numa matinée no Quarteto em que, duas filas à frente, estava o José Afonso, e o que eu gostei deste filme e dele nem uma palavra consigo alinhar, também essa deliciosa brincadeira que É Sempre a Mesma Canção, ternuras várias ao som das canções francesas que marcaram tempos, histórias envolvidas em canções de histórias tão simples ou mesmo sem história.

Ah!... e esse Último Ano em Marienbad para voltar a ser uma viagem de regresso e de que tornarei com pouco ou nada compreender, nem querer compreender, talvez porque o tempo não significa nada, como a certo ponto diz o homem, a que se tem de  juntar uma banda sonora inacreditável e envolvente, talvez o tempo das escuridão, talvez das trevas… regressar a Marienbad...

É assim a história do cinema. Também a nossa história.

Todos somos dotados de memória e todos fazemos as mais diversas tentativas para esquecer essas memórias…

Acabamos por ficar sós.

Será mesmo o fim da noite?

Resnais já não nos poderá ajudar mais.

Legenda: Reprodução da abertura que o realizador Fernando Lopes escreveu para um dossier sobre Hiroxima  Meu Amor, publicado no nº 1 do Cinéfilo de 4 de Outubro de 1973.

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