Já mais de uma vez por aqui disse que gosto
muito de Manual de Pintura e Caligrafia de José Saramago.
Pelo tempo em que o comprei, pelo tempo em que o li, pelo tempo em
que pressenti que por ali andava coisa boa, mas só muito lá para a frente dos
anos se saberia que ao autor lhe atribuiriam o Nobel da Literatura.
Na minha visita quase semanal, à Frenesi Loja, topei com
um informe de que está à venda a 1ª edição do Manual de Pintura e Caligrafia pelo preço de 180,00
euros, com a garantia de bom estado e miolo limpo, e a Frenesi nunca engana quem por
lá passa ou encontra os proprietários, aos sábados, no Chiado, junto à Bertrand.
Interessante o acrescento de Joana Varela, que os livreiros
colocam na apresentação do volume, e que termina com um tímido recomendável.
Das fichas de leitura do serviço de Bibliotecas Itinerantes da Fundação
Calouste Gulbenkian, assinada por Joana Varela em 1984:
«Se José Saramago quisesse ser exacto e gostasse de desvendar segredos, em vez de “Manual de pintura e caligrafia”, chamaria muito simplesmente ao seu livro “Manual de vida”, porque, no fundo, é só disso que se trata: Um pintor de retratos da alta burguesia lisboeta, H., começa simultaneamente o retrato “oficial” de S., administrador de uma empresa, um retrato clandestino onde procura pôr o que no primeiro se escapa e uma espécie de diário. A como que finura que o segundo retrato instala na sua pintura, é homóloga da finura da reflexão que a escrita inaugura – e ambas tendem para a ruptura: do modo de vida, do modo de arte, do modo de pensamento. Tudo acaba por convergir numa teoria, aliás por diversas vezes expressa no livro: toda a literatura é autobiográfica, todo o retrato é auto-retrato, toda a forma de arte é forma de vida. E vice-versa. O que o livro relata, portanto, é, na primeira parte, uma conversão à estranheza da intimidade e, na segunda, à sua habitação – no entanto, porque o escritor só deve falar de tudo que sabe, a primeira parte, a do cinismo, a da distância, a da auto-impiedade é infinitamente superior à conclusão, adocicada por um encontro que tem a dupla vantagem e cegueira de ser amoroso e político. De qualquer forma, [...] pensamos que a sua aquisição é recomendável.».
«Se José Saramago quisesse ser exacto e gostasse de desvendar segredos, em vez de “Manual de pintura e caligrafia”, chamaria muito simplesmente ao seu livro “Manual de vida”, porque, no fundo, é só disso que se trata: Um pintor de retratos da alta burguesia lisboeta, H., começa simultaneamente o retrato “oficial” de S., administrador de uma empresa, um retrato clandestino onde procura pôr o que no primeiro se escapa e uma espécie de diário. A como que finura que o segundo retrato instala na sua pintura, é homóloga da finura da reflexão que a escrita inaugura – e ambas tendem para a ruptura: do modo de vida, do modo de arte, do modo de pensamento. Tudo acaba por convergir numa teoria, aliás por diversas vezes expressa no livro: toda a literatura é autobiográfica, todo o retrato é auto-retrato, toda a forma de arte é forma de vida. E vice-versa. O que o livro relata, portanto, é, na primeira parte, uma conversão à estranheza da intimidade e, na segunda, à sua habitação – no entanto, porque o escritor só deve falar de tudo que sabe, a primeira parte, a do cinismo, a da distância, a da auto-impiedade é infinitamente superior à conclusão, adocicada por um encontro que tem a dupla vantagem e cegueira de ser amoroso e político. De qualquer forma, [...] pensamos que a sua aquisição é recomendável.».
Face às observações dos donos da Frenesi Loja, constato que a maior parte dos livros da minha biblioteca, vivem do problema de que estão fartamente
manuseados e, porque largamente sublinhados, não apresentam miolo limpo.
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