terça-feira, 4 de agosto de 2015

OS IDOS DE AGOSTO DE 1975


4 de Agosto de 1975

NO APONTAMENTO que José Saramago escreveu para a edição de 1 de Agosto do Diário de Notícias lia-se:
O que está em curso é, nem mais nem menos, uma grande manobra nacional de traição, ligada a uma grande manobra internacional de corrupção e intriga.
O presidente Ford, em Washington, acusava a União Soviética de auxiliar sub-repticiamente os comunistas em Portugal e lamentava que a CIA não pudesse interferir livremente em Portugal.

SOB A AMEAÇA de populares cerca de 40 militantes do PCP foram evacuados da sede do partido em Vila Nova de Famalicão.
Na Póvoa do Lanhoso centenas de pessoas lançaram-se ao assalto das sedes do PCP e do MDP/CDE.

CERCA DE VINTE E CINCO MIL manifestantes tomaram parte numa manifestação de cristãos da diocese de Coimbra, em que Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Gonçalves foram apupados.
A abstenção nesta hora seria um crime, pois a hora é de acção, disse D. João Saraiva, bispo de Coimbra.

NOS IDOS DE JULHO ficámos a saber que Otelo, no regresso da sua viagem a Cuba, declarou que Mário Soares era a mais segura esperança da direita.
Em 1976, Dominique Pouchin, à conversa com Mário Soares lembrou-lhe a afirmação, e Soares disse:
Tive sempre um certo fraco por Otelo. O seu lado quixotesco e quimérico tornava-o, quanto a mim, mais simpático do que inquietante. Sempre me pareceu um personagem generoso e espontâneo, um militar corajosos, mas um péssimo político. A imprensa prestou-lhe um muito mau serviço suscitando as suas reacções a propósito de tudo e de nada, o que contribuiu para dar dele a imagem de um homem inconsequente. É-o efectivamente, e isso valeu-me algumas dificuldades quando acusou o embaixador americano de ser um agente da C.I.A., declarando, que, por isso, não estava em condições de poder garantir a sua segurança. Os seus arrebatamentos e as suas saídas intempestivas feriram os sentimentos profundos do Povo Português, que, durante algum tempo, levou a sério as suas ameaças. Os seus volta-faces contínuos e as suas piscadelas de olho à extrema-esquerda acabaram por o desconsiderar aos olhos de muita gente. Otelo foi sempre um homem imprevisível que a pouco e pouco perdeu o pé nas águas turvas onde em certo momento vegetou perigosamente a nossa revolução. Não tinha a menor cultura política e chegou a lamentar, curiosamente, que a sua falta de formação o impedisse de ser um «Fidel de Castro português, ou mesmo europeu»…

Fontes:
- Acervo pessoal;
Os Dias Loucos do PREC de Adelino Gomes e José Pedro Castanheira.
- Portugal: Que Revolução, Mário Soares em Diálogo com Dominique Pouchin,
  Perspectivas e Realidades, Lisboa, Abril de 1976.

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