Hiroshima
John Hersey
Tradução:
Rogério Fernandes
Capa: Bernardo
Marques
Colecção
Miniatura nº 87
Livros do
Brasil, Lisboa, s/d
Exactamente às oito horas e quinze minutos da manhã de
6 de Agosto de 1945, hora japonesa, no momento em que a bomba atómica
relampagueou sobre Hiroshima, a Menina Toshiko Sasaki, empregada de escritório
na secção de pessoal da “Construções Metálicas da Ásia Oriental, acabava
precisamente de sentar-se no seu lugar no escritório da fábrica, e estava a
voltar a cabeça para falar à rapariga da secretária mais próxima. No mesmo
momento, o dr. Mazakazu Fujii instalara-se de perna traçada no pórtico da sua
clínica particular, debruçada sobre um dos sete rios do delta que divide
Hiroshima, a fim de ler o “Asahi” de Osaka; a srª Hatsuyo Nakamura, viúva de um
alfaiate, encontrava-se à janela da cozinha observando um vizinho que demolia a
sua casa situada numa linha de protecção contra incêndios causados por ataques
aéreos; o Padre Wilhelm Kleinsorge, sacerdote alemão da Companhia de Jesus,
deitado em trajos menores numa cama do último dos três andares do prédio pertencente
à sua Ordem, lia uma revista jesuíta, “Stimmen der Zeit”; o dr. Terefumi
Sasaki, jovem membro da equipe de cirurgia do amplo e moderno Hospital da Cruz
Vermelha da cidade, caminhava por um dos corredores do edifício, levando na mão
uma amostra de sangue para uma reacção de Wassermann; e o reverendo sr. Kiyoshi
Tanimoto, pastor da igreja metodista de Hiroshima, descansava à porta de um
homem rico, em Koi, o subúrbio ocidental da cidade, e preparava-se para
descarregar um carro de mão cheio de coisas que tinha evacuado da cidade com
medo de um ataque maciço dos B-29 que toda a gente espertava que Hiroshima
sofresse. A bomba atómica matou cem mil pessoas e estas seis ficaram entre os
sobreviventes. Ainda se espantam de estarem vivos quando tantos outros
morreram. Cada um deles aponta os múltiplos pormenores de sorte ou vontade – um
degrau subido a tempo, a decisão de entrar num edifício apanhando um eléctrico
em vez do eléctrico seguinte – que os salvaram. E agora, cada um deles sabe que
no acto de sobreviver viveu uma dúzia de vidas e viu mais morte do que alguma
vez pensara poder ver. Naquele momento nenhum deles percebeu o que quer que
fosse.
Sem comentários:
Enviar um comentário