quinta-feira, 5 de setembro de 2019

HÁ TANTOS NEGÓCIOS QUE CORREM MAL... O DELE FOI UM DESSES!!!


Ter o exacto pressentimento de que não me deveria meter nisto.

Claro que ainda se pode dizer que vivemos os últimos dias da estação estúpida, mas – bolas! – nunca fui homem de ferro e não seria agora que passava a ser.

Ida ao barbeiro para aparar os poucos cabelos que restam,

O senhor Vítor é o barbeiro do bairro – devo-lhe, há anos, um texto com fotografias e tudo, a colocar aqui no Cais - , que há largo tempo frequento.

Apesar de ser Verão, cheguei e o senhor Vítor ainda estava às voltas com um cliente. Tempo de esperar e folhear os jornais e revistas que por ali estão. Os clientes compram, lêem, dão duas de conversa com o Sr. Vítor e deixam-lhe as revistas e os jornais para desfrute da clientela.

Peguei numa revista-dita-dor-de-rosa porque na capa vinha o ex-Dono Disto Tudo.

Fiquei basbaque a olhar para aquilo e digo-vos, desde já, que foi algo que me perturbou até ao limiar do vómito.   

Calculava que as coisas assim se passassem, ia dizendo não pode ser possível, mas está ali tudo, ou quase tudo.

A personagem continua a fazer a faustosa vida que sempre fez.

As férias na Comporta – as finanças já não tinham tomado conta daquilo? – têm algumas variantes: já não vão com tanta frequência aos restaurantes caríssimos da zona, o «Sal» ou o «Sublime», preferem encomendar a comidinha que prontamente lhes é levada a casa, e já não utilizam cartões, tudo é pago em dinheiro.

Por detrás de tudo isto estão todos os coniventes na enganosa e derradeira «expansão» do BES: o governador do Banco de Portugal, o ex-presidente Cavaco Silva –«para serem mais honestos do que eu têm de nascer duas vezes.» - todos os capachos e capachinhos que viveram à sombra das salgalhadas do BES.

Gente que devia estar a pão-e-água numa prisão ou num asilo.

Mas não, passeiam-se por aí, gozam férias paradisíacas, vestem bem, comem do melhor, deslocam-se em carros topo-de-gama.

Gente ingénua, também gananciosa, embalada por cantos de sereia, entregou-lhes as poupanças de uma vida.

Ficaram sem nada.

Uns não aguentaram o embate e suicidaram-se.

Outros estão a sobreviver rodeados de terríveis dificuldades.

Tenho a velada (?) ideia de que os casos de justiça que envolvem José Sócrates, Ricardo Salgado, outros personagens, acabarão por não dar em nada.


Os olhos continuam incrédulos a mirar a revista de sargeta, que peço emprestada ao senhor Vítor para fazer o recorte testemunhante.

Escreve o repórter: «houve muita gente que pensava que Ricardo Salgado não voltava a por os pés na sua amada Comporta, mas tal não tem acontecido. Compra os jornais na papelaria da povoação e ninguém esconde a simpatia que nutrem pelo casal. Diz o proprietário: «São meus amigos. Gosto muito dele, é muito educado e atenciosos dá sempre os bons dias e pergunta se está tudo a correr bem. Aqui a gente protege-o muito e evita dizer se ele está ou não, para não o incomodarem nas férias. O que dizem dele até pode ser verdade, mas a meu ver, há tantos negócios que correm mal… o dele foi um desses.»

Ainda o repórter: «Cristão praticante, mesmo estando de féria, Ricardo Salgado não falta às homilias semanais numa igreja local.»

Se esse tal Deus existe, e só ele sabe da tranquilidade do meu ateísmo e do respeito que tenho pela fé dos outros, apresto-me a gritar:

«Deus, não lhes dês o perdão porque eles sabem o que fazem!»

Esta gentalha merece todo o meu desprezo.

Estou desesperado, continuo a ter o exacto pressentimento de que não me deveria meter nisto… claro que não sou de ferro... também faz-se tarde e, como diria o Astérix, tenho um javali ao lume.

4 comentários:

Luis Eme disse...

As palavras do "protector" de Salgado, são um bom retrato de muitos portugueses, que ainda parecem viver numa monarquia feudal, adorando prestar vassalagem aos "senhores", mesmo que sejam canalha da pior espécie (como é o caso...).

Fica-me mal dizer isto, mas este nosso país é tão rasca, Sammy.

Sammy, o paquete disse...

O meu português torna-se mais medíocre quando tenho de escrever sobre estes personagens.
O amargo e lúcido Jorge de Sena abre assim um poema: «Que adianta dizer-se que é um país de sacanas?»
Tenho a certeza que deveria ter passado esta porcaria sem escrever uma palavra. Mas se não escrevesse também não ficaria bem.
Donde, alivio a bílis voltando a Sena, a este dístico: «De uma palavra sei que tem sentido: é desespero: não importa a causa.»
Sobre a tal vassalagem, de que fala o Luís, lembra-se que aquele rapaz, Carlos Silva, que é secretário-geral da UGT, ter dito aos jornalistas que não aceitou o cargo sem ter falado com Ricardo Salgado, seu patrão?

Sammy, o paquete disse...

Não acredito, mas dizem que há bruxas.
Peguei nos «40 Anos de Servidão» do Jorge de Sena e salta-me de lá uma folha com um texto copiado do «Largo da Memória» que entendi, nesse tempo, publicar aqui no Cais e por um qualquer motivo ficou no olvido. Vou repescá-lo porque gosto muito.
Trata-se da «Carreira da Saudade» de Joaquim Nascimento. Aliás, de Joaquim Nascimento, roubados do «Largo da Memória» publiquei outros textos. Este de que falo agora, será publicado, com a devida vénia, no domingo que, como dizia Manuel da Fonseca, é o dia para um homem fazer as coisas mais belas da vida.
Abraço

Seve disse...

Isto é a VERGONHA de um país!