segunda-feira, 30 de maio de 2022

COM OS JACARANDÁS AO FUNDO


 Dêem-lhe nada para fazer e ele exulta.

Amanhã começo a estudar, era frase preferida quando andava no liceu e um qualquer amanhã para estudar, como tantos outros, nunca apareceu.

Não chegou a doutor, nem a engenheiro, nem a arquitecto, não chegou a nada.

E quando a vida o obrigou, pegou no que lhe apareceu à mão, e aí, ainda se lembrou dos conselhos do avô paterno que, no que quer que fosse, devia sempre fazer o seu melhor. Até a vender cascas de alhos, temos de dar o melhor.

O paleio vem a talhe de foice porque encontrou, nestes dias difíceis que vai atravessando, em ficheiros diversos, uma série de histórias que prometeu, por aqui, ir contando.

Ainda lá está, quase prontinho, o texto a falar das (não) razões porque nunca acabou o Ulisses do James Joyce.

Mas conclui, hoje, uma história que já vem do tempo da última Feira do Livro.

Desenterrando António Lobo Antunes.

Ainda a ideia triste que alguém teve – o autor? A editora – de abandonar a publicação, em livro, das crónicas que vai escrevendo, ainda a face mais legível do que escreve.

Um dia perguntaram-lhe:

- Porquê as crónicas?

- Não tinha dinheiro e era bem pago.

Tenho os livros que reúnem as crónicas do Lobo Antunes, mas ao olhar o pavilhão da Dom Quixote, ou da Leya, ou do raio que os parta, vi um cartaz que anunciava uma antologia de crónicas do autor. Como me perco por antologias porque uma antologia é sempre gratificante, como ter todos os discos do Leonard Cohen e nunca deixar de comprar os «besto of». 

Arranquei para comprar o livro mas, espanto dos espantos, leio que o prefácio é de Marcelo Rebelo de Sousa.

Não sei do que o Marcelo percebe, talvez de sebentas, mas livros não se me afigura. 

Mas como presidente dos afectos e das fotos beijoqueiras, do opinar sobre tudo e mais alguma coisa, prefaciar um livro de crónicas do Lobo Antunes parece-me um destempero a que não sei dar nome.

O livro ficou por lá.

Possivelmente vendeu, tal como eles gostam...

Melhor ficar por aqui?

Parece que sim!

3 comentários:

Seve disse...

"Não sei do que o Marcelo percebe, talvez de sebentas, mas livros não se me afigura."

Ó Sammy esta sua análise deixou-me de boca aberta, até posso estar completamente enganado, mas eu acho que se o Marcelo de algo percebe será de livros.

Ou será que o Sammy se baseia em algo que eu desconhecerei, para fazer tão convicta afirmação ?
Fico realmente curioso.

SAmmy, o paquete disse...



Agora, não há dia nenhum em que não acorde mal disposto, completamente envinagrado.
Arranjei aquela brincadeira de andar às voltas com o Manuel António Pina, o José Saramago, o Eduardo Guerra Carneiro, o Wood Allen, outros autores, mas nem sempre as coisas correm como deviam correr.
A história da habilidade de a Leya publicar uma antologia das crónicas do António Lobo Antunes, ocorrida durante a Feira do Livro do passado ano, deixou-me mal-disposto, chateado, muito chateado, mesmo. Devia ter feito o texto de protesto naquele tempo exacto. Esqueci-me. Quando agora vi que não tinha feito nada, mais chateado fiquei.
Já o prefácio do presidente Marcelo, que nem sequer li, deixou-me fora de mim. Marcelo quer estar em todas, dar-se a ouvir seja pelo que for. Mas toca tudo pela rama. Aquela avalanche de livros que ele apresentava nos domingos de catequese da TVI, treino afincado para a futura presidência, era apenas show-off. Os livros estavam todos intactos, com as lombadas intocáveis e alguém que lê, e gosta muito de ler sabe sempre quando um livro foi lido ou está a ser lido.
Portanto, caro Seve, não tenho nada na manga sobre o Marcelo não perceber de livros, claro que tenho de colocar os de estudo fora desta questão. Apenas um «feeling», mas com a idade que levo, já devia saber que os feelings são para guardar dentro de nós e nada mais. O resto foi uma inconsciência, uma leviandade que não deveria ter sido publicada pelo que me resta pedir ao viajante Seve, humildes desculpas.

Seve disse...

Bom dia caro Sammy.

Como o compreendo, passamos tempos difíceis que parecem querer envenenar-nos o dia a dia.
Fez bem em escrever o que, na altura, sentia e confesso que acho que não escreveu nada de mal nem há o mínimo motivo para desculpas.

Acredite que apenas fiquei curioso e expectante com o seu ponto de vista que, sinceramente, não me causou o mínimo incómodo pois, repito, compreendo-o perfeitamente, mas a minha curiosidade para o conhecimento é algo que faz parte da minha personalidade.

Obrigado pelo seu esclarecimento e fico-lhe grato pela sua consideração.
Um abraço.