quinta-feira, 26 de maio de 2022

VELHOS DISCOS


 Dois viajantes do Cais comentaram a morte de Vangelis.

Entendi que um texto serviria melhor do que um comentário circunstancial.

 Sou mais de livros e de filmes do que de músicas. Musicalmente não sou tipo de confiança. Todo o meu gosto musical é caótico, uma completa anarquia, não dá para entender. Se gosto, gosto, se não gosto, passo à frente.

Vai de Vivaldi ao Conjunto da Maria Albertina, passa por Tony Bennett, Pete Seeger, Gram Parsons, Neil Young, Agostinho dos Santos. Maysa Matarazzo.

Confusos?

Certamente que sim, mas a família diverte-se, os amigos nunca entenderam e, no fundo, apenas tento seguir os passos do velho Saint-Just quando dizia que a felicidade, seja lá o que isso for, é possível!

Eram de 78 RPM os primeiros discos de casa do meu pai, que rodavam num pick-up instalado num móvel com um rádio Blaupunkt que, para além do alti-falante central, tinha dois laterais.

O meu pai tentava fazer perceber ao meu avô que aquilo era a estereofonia, o meu avô era quase surdo e acenava com a cabeça.

Os bailes de aniversário, ou Carnaval, tinham, por exemplo, o Renato Carosone a cantar Torero ou a Picolissima Serenata, também Nat “King” Cole e Line Renaud, enfim, o que havia à mão, e não era muito.

Os tais bailes da vida como, noutro contexto, diria, o Milton Nascimento.

Vieram depois uns 33 RPM, (que eram um LPsmais curtos) Popular Favourites da Philips com selecção de canções do Frankie Laine, da Jo Stafford, dos Four Aces, a Rosemary Clooney, o Louis Armstrong a Orquestra de Roberto Inglês, por aí fora.

Depois chegaram os EP”. O meu pai tornou-se um fã do Paul Anka, do Pat Boone e o Volare cantado pelo Dean Martin

Os 78 rotações partiram-se. Guardava um da Hebe Camargo a cantar Índia, mas nunca mais o vi. Dos EPs e dos 33 rotações a maior parte perdeu-se ou foi desviada.

O passar a conhecer outras músicas, devo-o ao programa Em Órbita, com histórias e memórias registadas, por aqui, com a etiqueta do programa.

O primeiro “EP” comprei-o na “Discoteca Universal” (30.06.1966), You Were on My Mind do Crispian St. Peters, por causa do The Pied Piper que  ainda ouço com imenso prazer e que me traz sempre à memória, o Cândido Mota a dizer, no Em Órbita já com as primeiras espiras a correr: sigam-me que eu sou o tocador da flauta mágica.

Mais tarde levei uma enxurrada de grande música, de grandes músicas, fornecidas pelo meu amigo Luís Miguel Mira, um profundo, mas mesmo profundo conhecedor de música, principalmente Folk Music e Country Music e que, volta e meia, nos delicia com histórias que por aqui tem publicado e é sempre bom lembrar que tem um livro publicado Crónicas da América que, com um bocado de sorte, pode ser encontrado em alfarrabistas ou feiras de livro ocasionais.

 Mas sempre fui um disperso em músicas e em estilos.

Lembro-me dos tempos em que andei apanhado pelos sons e vozes da Motown, lembro-me quando andei a comprar discos do Vangelis porque, mercê de largos gin-tónicos no British –Bar, descobri que Vangelis levara a música electrónica a um outro nível.

E houve aquela pancadinha pelo trabalho que Vangelis fez com o Joe Anderson, o vocalista dos Yes

Dois discos ficaram por aí.

Peguei no Friends of Mr Cairo porque tem uma canção I’ll Find My Way Home.

Reproduzo a capa do disco que tem a curiosidade de no topo do lado direiro, num rectangulozinho branco, ter o preço: 350$00, que ao cambio da moeda de hoje seriam una 1,75 euros, mas naquele tempo, para o teso que sempre fui, era dinheiro.

Há uns bons tempos atrás, a minha filha Sara, hoje com 44 anos, perguntou-me se eu ainda tinha o LP. Acrescentou então que I’ll Find My Way Home, de tanto a ouvir cá por caso, ficara como uma das canções da vida. Respondi-lhe que nunca me apercebera,  mas entendi, porque é sempre bom saber o sítio onde se cai, e nunca esquecer o caminho de casa, também porque só estaremos sozinhos, se quisermos mesmo que isso aconteça.

O Alexandre O’ Neil , numa entrevista, deixou uma fabulosa ideia sobre a solidão:

«A solidão procurada é boa., a não procurada, às vezes é chata.

O estar sozinho não é a solidão. Às vezes está-se sozinho porque se quer e isso pode dar um bom monólogo, uma meditação. O facto de eu viver só é que, às vezes, é chato e vou até ao barbeiro da esquina só para falar com alguém.»

1 comentário:

Seve disse...

Ó Sammy, só a capa deste LP me causa arrepios...parece que são 6 da tarde e estou a subir a Rua do Carmo e lá está a capa exposta na loja de discos Melodia (era eu um menino que saía do trabalho e subia ao Chiado antes de ir para casa)
"Friends of Mr Cairo" um dos discos da minha vida. "I’ll Find My Way Home" uma das canções da minha vida.
A dupla Jon and Vangelis marcaram uma época da minha vida.
John Anderson, não me cansava de ouvir esta voz angelical.

Reproduzo