terça-feira, 7 de junho de 2011

SARAMAGUEANDO


No Verão de 1974, José Carlos de Vasconcelos, alternadamente, com Fernando Assis Pacheco apresentavam, semanalmente, um programa televisivo a que chamaram  “Escrever É Lutar”. O programa não chegava a ter trinta minutos de duração, e era transmitido durante a hora do almoço, um horário de fraca audiência. Mas por lá  passaram escritores a quem a televisão da ditadura votara ao completo silêncio.

José Saramago foi um dos entrevistados por José Carlos de Vasconcelos.

No dia 18 de Setembro de 1974, o “Diário de Lisboa” publicava a crítica ao programa, e em título lia-se: “José Saramago: não necessita de apresentação”.

O título escolhido por Castrim transpira a amizade que tinha por José Saramago, conheciam-se do “Diário de Lisboa”, - e não só! – porque, em Setembro de 1974, José Saramago, para uma grande parte dos leitores portugueses, era um ilustre desconhecido.


Tinha publicado um romance que renegara – “Terra do Pecado”, dois livros de poemas – Os Poemas Possíveis” e Provavelmente Alegria” – dois livros de crónicas – Deste Mundo e do Outro” e “A Bagagem do Viajante” - e os editoriais que escreveu para o “Diário de Lisboa”  que a “Seara Nova”, em Janeiro de 1974, reuniu no volume As Opiniões que o DL Teve”, todos publicados antes do 25 de Abril.

O primeiro livro, pós 25 de Abril”, é “O Ano de 1993”, publicado em 1975.

Estes são alguns excertos dessa crítica de Mário Castrim:

“De tão poucas pessoas se poderá dizer que o estilo é o homem como de José Saramago. A poesia rigorosa, a palavra firme, a frase inflexível até chegar ao seu fim: eis mais do que a expressão de um estilo, o retrato de um homem. Um rosto anguloso e duro, um olhar em lâmina de aço. A tranquilidade que envolve uma inquietação e, subjacente a tudo isso uma, uma ternura que de súbito irrompe – eis, mais do que o retrato de um homem a expressão de um estilo.(…)
A força dos artigos de José Saramago era essa: o leitor percebia logo a intervenção nem que fosse de pequena cirurgia.(…)
José Saramago aponta decididamente para a responsabilidade do escritor enquanto cidadão e político.(…)
Daqui o saúdo, rosto severo e bom, numa televisão que durante tantos e tantos anos o ignorou, em paga do seu desprezo. Daqui saúdo em José Saramago a força do intelectual que o fascismo não conseguiu vencer.
Homem de opinião, homem de qualidade. A quem é bom chamar amigo.”

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