sexta-feira, 25 de abril de 2014

O DIA INICIAL INTEIRO E LIMPO


25 de Abril de 1974 

Dezassete horas e 45 minutos bastaram para derrubar uma ditadura que durou 47 anos, 10 meses, 34 dias e algumas horas.

A Assembleia Nacional abriu portas mas, por falta de quorom, não houve plenário.
O presidente, Engª Amaral Neto, sabedor (?) do que estava a acontecer no país, mas, possivelmente acreditando num qualquer milagre, marcou sessão para o dia seguinte, à hora regimental.

Texto lido num jornal de que não encontro o nome, nem o autor:
 Massacravam-nos os ouvidos com afirmações de coragem.
Diziam que, se alguma vez o chamado estado Novo corresse perigo. Iriam dar tiros para a rua.
Afirmavam-se prontos a morrer.
Juravam, rejuravam e trejuravam que o Povo só chegaria ao poder passando por cima dos seus cadáveres.
Gritavam aos quatro ventos que iriam vender cara a vida.
Consideravam-se soldados de uma guerra gloriosa.
Não perdiam uma ocasião de proclamar o desejo que tinham de provar a sua fidelidade vertendo, para tal o seu próprio sangue.
Arrotavam postas de valentia.
As suas permanentes gabarolices, infantis e monocórdicas, tinha-nos levado a crer que, no dia da mudança, iriam fazer qualquer coisa.
Dar um grito, por exemplo – um grito, um suspiro, um soluço.
Mas nem isso.
No dia vinte e cinco de Abril, os heróis do palavreado não cumpriram uma única das promessas que tinham feito.
Perderam o pio.

Miguel Torga escreveu no seu Diário:
Golpe militar. Assim eu acreditasse nos militares. Foram eles que, durante os últimos macerados cinquenta anos pátrios, nos prenderam, nos censuraram, nos apreenderam e asseguraram com as baionetas o poder à tirania. Quem poderá esquecê-lo? Mas, pronto: de qualquer maneira, é um passo. Oxalá não seja duradoiramente de parada…

Quando os portugueses souberam que, durante a madrugada, as Forças Armadas, desencadearam uma série de acções com vista à libertação do país, do regime que há longo tempo o domina, já os matutinos tinham as suas edições fechadas.
Só em segundas e terceiras tiragens, tanto O Século como o Diário de Notícias, deram os primeiros flashs do que estava a acontecer.
Às 5,30 Horas O Século publica uma 2ª edição em que coloca no canto superior direito: Ocupadas por militares algumas estações emissoras, remetendo para Últimas Notícias. em que pouco ou nada adiantam e ainda mantiveram a notícia da visita, ocorrida na véspera, do Chefe de Estado Tomás  ao Salão de Antiguidades.



Apenas numa 3ª edição, saída para rua às 11 horas, colocam em título a toda a largura da 1ª página: Movimento das Forças Armadas desencadeou uma acção militar para deposição do regime político e colocam esta abertura a quatro colunas:
O clima de inquietação política que mais acentuadamente vinha a patentear-se desde a segunda quinzena de Dezembro, e que a partir da última semana de Fevereiro ganhara iniludíveis aspectos de crise, pondo em causa a própria estabilidade do regime, culminou esta madrugada com o desencadear de uma acção militar que de imediato proclamou o propósito de promover a deposição da situação política vigente no País.
Uma 2ª tiragem do Diário de Notícias dedica toda a 1ª página aos acontecimentos: Às primeiras horas da madrugada de hoje eclodiu um movimento militar.
Outros destaques da 1ª página, mostravam que se desconhecia onde se encontravam o Chefe de Estado e o Presidente do Conselho e que o General Spínola não achou oportuno falar ao «Diário de Notícias».



 Na 2ª página, com fotografia a três colunas, a notícia de que o Chefe de Estado recebera o governador civil de Santarém, o presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere e outras individualidades da região, que o convidaram para, durante o fim-de-semana, visitar a Freguesia de Châos, do Concelho de Ferreira do Zêzere, que concluíra  a electrificação da freguesia.
Na página de espectáculos o anúncio da estreia às 23,45 Horas, no cinema Londres, do filme de Alain Resnais, Hiroshima Meu Amor, largamente retalhado pela censura e classificado para maiores de 18 anos.
No Maria Vitória estava em representação a revista Ver, Ouvir e Calar com Ivone Silva, Salvador, Mariema e Barroso Lopes.
Na 4ª página, fotografia a três colunas com a notícia de que, nascidos na segunda-feira, cisnes bebés eram presentemente a maior atracção da Avenida da Liberdade (lago oriental.
Ma 13ª página a crónica, assinada por Guido Carvalho dando conta da derrota Sporting no jogo com o Magdeburgo e que finalizava deste modo:


 Claro que nada disto aconteceu. O avião ficou retido em Madrid, os jogadores viajaram para a fronteira e ficaram a aguardar autorização de entrada em Portugal.
Na página 13 uma notícia, sem designação de publicidade qua ainda não se usava, dando conta que o Centro Comercial Imaviz iniciava a sua fase de arranque com a presença, vindo directamente de Nova Iorque do arquitecto Adolph Novak.
Os jornais da tarde, apesar de trazerem mais notícias sobre o Movimento dos Capitães, mantêm as edições que já estavam paginadas.
No Diário de Lisboa Mário Castrim titula a sua crónica: O sol é bom, as mulheres vestem bem e o mais que adiante se verá...


 Na pág. 8 notícia de militares mortos no Ultramar e que a Guiné, por falta de concorrentes a organização do concurso de Miss Guiné, foi obrigada a desistir à última hora da participação da província no concurso de «Miss Portugal» 


 O jornalista Armando Pereira da Silva registava a sessão do dia anterior na Assembleia Nacional:


 Na última página um comunicado do Movimento das Forças Armadas que tinha sido difundido pelo Rádio Clube Português



 Olhando a 1ª página do Diário Popula,r constata-se que, a propósito de um comunicado pedindo o fecho dos estabelecimentos comerciais, o Movimento dos Capitães, para os responsáveis do jornal, às 11,40, eram sublevados.
                       

Legenda da fotografia:
A meio da manhã, na Rua do Arsenal, frente a frente forças leaiss ao governo e forças revolucionários.

Legenda: Capa da 1ª edição do República de 25 de Abril de 1974.

Em rodapé: ESTE JORNAL NÂO FOI VISADO POR QUALQUER COMISSÃO DE CENSURA

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