Andando a
folhear livralhada, fui dar a um livro que é uma conversa do Baptista-Bastos,
em Lanzarote, com José Saramago.
Esta fotografia de
dois homens, dedicadíssimos amigos e camaradas, é tirada de lá.
Pela sua
claridade, a fotografia não se presta a uma boa digitalização.
Mas é uma
fotografia que considero muito bonita.
Bonita pela
conversa, interessantíssima, certamente, que estavam a ter, com uma garrafa de whisky
Ballantines, no canto direito, em cima de uma cadeira.
Hoje, passam 21
anos sobre a morte de Fernando Lopes Graça e fui buscar estas palavras de Saramago
sobre a morte do Graça, o amigo do coração.
Na entrada que
colocou no 1º volume dos Cadernos de Lanzarote, dois dias depois da
morte, de Lopes-Graça, José Saramago escreveu:
Morreu o Fernando Lopes-Graça. Telefonaram hoje
da TSF, muito cedo, para pedir-me, como depois verifiquei no gravador, o
cumprimento desse dever mediático a que se dá o nome de depoimento. Deixaram
números de telefone, mas não liguei. Por pudor acho eu. E agora acabo de saber,
por Carmélia, que o Graça morreu sozinho. Creio que esta última solidão me doeu
mais ainda que a própria morte. Não vai faltar quem diga que o Lopes Graça
morrendo aos 88 anos, tinha vivido já a sua vida. Como frase de consolação,
talvez sirva para quem se satisfaça com o que lhe foi dado. Por mim, penso que
nunca acabamos de viver a nossa vida.
Nesse dia, José
Saramago não ligou para a TSF, mas dias depois, escreveu um
depoimento para o JL, que também pode ser lido nos Cadernos:
Morreu o querido Graça, o amigo do coração, o camarada
fidelíssimo e leal. Tudo isso acabou. Sim, já sei, a recordação, a memória, a
saudade, a lembrança. Essas coisas duram, de facto, mas porque duram, cansam.
Um dia destes a evocação de Lopes-Graça só causará uma leve mágoa, que
disfarçaremos contando uma das sua mil vezes repetidas anedotas. Buscaremos
então o Graça onde ele verdadeiramente sempre esteve: nos seus livros, de uma
linguagem puríssima que poderia servir de lição a escritores, principiando por
este; nos seus discos, mas também nas salas de concerto, que não lhe abriram
tanto quanto deveriam enquanto viveu. O homem acabou, não podemos pedir-lhe
mais nada, mas a obra aí ficou, à espera do que sejamos capazes de pedir a nós
próprios. O justo juízo vem sempre depois, quase sempre tarde de mais. Talvez
seja essa a causa do amargor de boca que sinto ao terminar estas linhas.
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