O tom intratável não foi bonito porque o assunto era
nosso, país em crise e confuso que merecia cortesia. Mas o tom tinha
justificações e ele próprio as deu: este governo eu não o quero, só o tolero
porque não tenho alternativa e vou tê-lo debaixo de olho! Eis o Presidente,
ontem. Compreende-se a indisposição. Mas de quem a culpa de não procurar novo
governo? Dele, pois os prazos estão esgotados para marcar novas eleições...
Então, porque não pensou nisso quando marcou as anteriores tão tarde e sem
tempo de retificar com outra ida às urnas? É que o resultado geral de 4 de outubro
nem foi surpresa, foi mesmo o mais provável: nenhum dos dois candidatos a
governar, Passos e Costa, teve maioria absoluta. Decorria desse facto esperado
que seria prudente arranjar uma almofada à crise. António Costa perante a tal
probabilidade de não haver maioria absoluta, já antes da campanha eleitoral foi
dizendo que não desdenhava alianças com ninguém - e, de facto, ele procurava
alternativa ao beco. Já Cavaco Silva meteu-nos a todos num problema - e com ele
sem mestria para o resolver. Costa assume-me político e talvez seja bom porque
encontrou uma solução para Portugal. Cavaco diz sempre que não é político, mas
é-o, há 35 anos, e mau, e comprou uma azia para ele. Agora estrebucha com
arreganhos que são só conversa. A política às vezes é como a natureza que gosta
de simetria: a dois meses sem governo vão seguir-se dois meses sem Presidente.
Ferreira
Fernandes, hoje, no Diário de Notícias.
Sem comentários:
Enviar um comentário