Tudo o Que Não Escrevi
Diário I
(1991-1992)
Eduardo Prado
Coelho
Capa: João
Machado
Desenho da
sobrecapa: David de Almeida
Colecção
Finisterra
Eduções ASA,
Porto, Abril de 1993
A minha avó paterna chamava-se Adelina. Não era a mãe
do meu pai, Palmira, que morrera quando o filho tinha dois anos apenas, mas a
tia, com quem o meu avô, prudente e institucional, decidira voltar a casar. O
meu pai manteve sempre uma extrema nostalgia pela mãe que mal chegara a
conhecer. Até porque a outra, a avó que eu conheci, era a imagem oposta:
personagem apagada, discreta, submissa, dedicada, modelo da mulher que vive na
vida do seu marido e que assume como uma missão sagrada substituir a irmã em
falta.
O meu avô lia-lhe tudo quanto escrevia. E ela ouvia-o
com interminável paciência, sem perceber quase nada (não tinha suficiente
cultura para isso). Contudo, adorava que ele lesse – forma generosa de o ajudar
a ouvir-se a si próprio. Sempre tive uma ternura sem limites por este
tipo de pessoas. Por isso mesmo chorei com a Shirley Mac Lane a ouvir
as novelas escritas por Frank Sinatra no filme de Minelli chamado Some
came running. E fiquei imensamente cúmplice do Manuel Gusmão quando
ele me disse um dia que chorava sempre com essas imagens.
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