Rómulo de
Carvalho nunca escondeu que apreciava os fundamentos doutrinários do Comunista,
chegando mesmo a dizer que era um comunista sem partido.
Neste passo das
suas Memórias, refere o dia em que o escritor Faure da Rosa o convidou
para aderir ao Partido Comunista Português:
No meio da desorientação geral em que os heróis do 25
de Abril não sabiam que fazer da sua vitória, começaram a surgir os sinais da presença
daqueles que, secretamente, desde há muitos anos planearam a sua intervenção
política quando a oportunidade surgisse. Era o Partido Comunista, firme e
determinado, o único agrupamento que sabia o que queria. Actuaram em força,
alcançaram algumas vitórias, mas o futuro foi-lhes adverso.
Foi nessa altura que o Partido procurou obter a minha
adesão. A pessoa que me convidou para um encontro foi um amigo de muitos anos,
o José Faure da Rosa, pessoa de reconhecimento, já falecido, romancista com
bastantes obras publicadas, totalmente caído no esquecimento. Encontrámo-nos no
Café Império, próximo da Fonte Monumental e aí me deu a razão do encontro,
anteriormente solicitado por telefone. Disse-lhe que não, que não aderia ao seu
Partido nem a qualquer outro. Na raiz da minha filosofia política, chamemos-lhe
assim, está seriamente instalada a total descrença no comportamento dos seres
humanos quando são elevados às cúpulas do poder. Eu detesto esta minha atitude
mas tenho que segui-la por imposição da minha natureza. Poderão minimizá-los em
casos pontuais mas sempre com grande ineficiência limitada pelas ambições de
quem governa e pelas utopias da ideologia que defende. A História dá-me razão,
não a História dos heróis mas a dos seres humanos. Felizmente a esmagadora
maioria não pensa nem sente como eu. Por isso acho muito bem que se batam por
este ou por aquele partido político, que dêem vivas e que deitem foguetes.
A favor da minha atitude vou dar-vos um exemplo muito
significativo. No regime anterior, chamado “fascista”, os governantes davam a
mão a quantos os aplaudiam, e procuravam desembaraçar-se de quantos lhes eram
manifestamente adversos. Os restantes, a grande massa da população,
adaptava-se, calava-se, e ia trabalhando para angariar o seu pão de cada dia.
Corridos os fascistas, ascenderam os democratas ao poder e, de imediato,
trataram de dar a mão a quantos os aplaudiam e a procurarem desembaraçar-se de
quantos lhes eram manifestamente adversos. Com uma diferença. Enquanto aqueles,
os tais fascistas, escudavam os seus procedimentos na trilogia “sublime” do
Deus, Pátria e Família, estes agora, os democratas, apoiavam o seu procedimento
na “sublime” Democracia.
Rómulo de
Carvalho em Memórias
Legenda: Anos
50: reunião, no Coliseu dos Recreios, de sindicatos corporativistas - «os
governantes davam a mão a quantos os aplaudiam.»
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