terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

QUOTIDIANOS


As pessoas não morrem: andam por aí. Quantas vezes as sinto à minha volta, não apenas a presença, o cheiro, a cumplicidade silenciosa, palavras que saem da minha boca e me não pertencem, penso

- Não fui eu quem disse isto

e realmente não fui eu quem disse isto, foram as pessoas mortas, exprimem opiniões diferentes das minhas, aproximam-se, afastam-se, vão-se embora, regressam, não me abandonam nunca. Em que parte da casa moram, qual o lugar onde dormem, devíamos deixar pratos a mais na mesa, talheres, copos, almoço que chegasse, os guardanapos nas argolas, um lugar no sofá, metade do jornal, dado que não se sumiram: andam por aí, invisíveis

De uma crónica de António Lobo Antunes na Visão.

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