Vamo-nos aproximando
do das derradeiras páginas das Memórias
de Rómulo/Gedeão.
Conta agora aos
tetranetos as homenagens que lhe fizeram em vida:
«…aqui para nós que ninguém nos ouve, achei demasiadas tantas
homenagens. Não me lembro de nenhum caso como este. Foi talvez único. Eu
imagino como os meus colegas de çetras, das poesias e das prosas, terão
franzido o sobrolho à medida que foram
tendo notícia dos acontecimentos. Mas que é isto? A surpresa deles teria sido
igual à minha. Achei sinceramente que foi demais.»
No dia 17 de Dezembro
de 1966, a Escola Secundária Pedro Nunes, antigo Liceu Pedro Nunes, homenageou
o seu antigo professor:
«Comecei por efectuar duas visistas aos meus antigos locais de trabalho
que deixei há vinte e um anos, em 1975. A primeira foi ao Laboratrio da Física
à entrada do qual descerrei o pano que cobria uma lápide sobre a porta que
atribuía o meu nome àquele espaço. Lá dentro tudo em ordem, o material nas prateleiras
dos armários (à excepção das peças roubadas pelos alunos após o 25 de Abril), e
a minha mesa de carpinteiro, que o reitor de então lá pusera a meu pedido, onde
saboreei longas horas em que nela serrei, limei, martelei, preguei».
(…)
«Num dos últimos dias do mês de Dezembro a Editora João Sá da Costa
lançou ao público uma edição da poesia de António Gedeão intitulada “Poesia
Completa”. É uma edição luxuosa, de grande formato, que reúne toda a minha obra
poética, os seis volumes que publiquei, ilustrada com dezasseis estudos do consagrado
pintor Júlio Pomar. A obra custa um pouco menos do que recebo, em dois dias, do
meu vencimento de miserável reformado. Também haverei de ser condecorado por
ter conseguido viver com tão pouco.»
(…)
«Reparando em tanta e
tanta gente que se me dirigiu, por escrito, ou por boca, em tanta gente que
participou nas diversas homenagens, gente de nomeada, professores universitários,
investigadores, cientistas, avulta o desinteresse dos letrados, dos escritores,
dos chamados intelectuais. O reduzidíssimo número dps que se manifestaram, três
ou quatro, fizeram-no porque foram especialmente convidados para colaborarem,
como foi o caso de Urbano Tavares Rodrigues, que estou certo nunca se lembraria
de me escrever, dando-me cumprimentos, se não o tivessem escolhido para falar
sobre mim na sessão da Academia das Ciências. Nem um só escritor se lembrou de
me enviar um cartãozinho de cumprimentos. Nem um só. Vocês, meus queridos
tetranetos, que me conhecem bem, sabem que isto, em mim, não é motivo de
aborrecimento, de desagrado, de ressentimento, de protesto, mas apenas motivo
de reparo. Reparei que nenhuma pessoa de letras, espontaneamente, me
cumprimentou. Recordei até aquele rapaz, de nome João de Melo, escritor, com
quem um dia conversei, que em certo momento me disse que eu era “um grande
poeta. Sim – disse eu. Tenho um metro e setenta e oito. Ele não se riu, nem
sorriu. Olhou-me sério e de sobrancelhas carregadas.»
Rómulo de Carvalho em
Memórias
Legenda: Liceu Pedro
Nunes
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