A vida está cada
vez mais cara
no meu tempo a
vida
era mais em conta
fazia menos calor
as cidades não
mudavam de lugar
corria uma brisa,
como uma vassoura.
O fruto, um
autómato surpreendido.
Desprendeu-se da
casca, que viu?
Um autocarro, um
avião, um submarino.
Os frutos frios
por fora
são por dentro
aquecidos a electricidade.
Os frutos davam
frutos, flores, brinquedos.
No meu tempo o rio
corria limpo
como um corredor
novo
nadávamos nus
uns pelo meio dos
outros
extraíamos um
amante do vulcão mais próximo.
A um dos meus o
mais novo
o mais próximo da
sua idade
matou-o o fumo!
Vivia-se até à
última.
A vida era mais em
conta; depois
derramaram-se
histórias sobre mim
os olhos de Buda
destilavam
penicilina, eram o
que se chama uns olhos
divinos.
Nunca mais quero
animais
em casa. Morriam
os animais
comprava-se
veneno, matava-se gente.
Muitos amantes
dormindo sobre a lava.
Morríamos em ilhas
separadas por
um cordão de rios
ininterruptos.
Nem tínhamos idade
para ser crianças num
continente.
Havia no meu tempo
fábricas
sumptuosas. Onde
se fabricava uma constelação
exacta e limpa, um
amor sumptuoso e seus afluentes,
e ínfimas máquinas
purgatórias.
Fabricava-se mais
e melhor que hoje.
Não há respeito
por ninguém;
por exemplo o
diamante
não tem a
utilidade de uma jóia:
é só um diamante
(para um asceta)
só um dia amante
(para um suicida).
Com uma jóia, sim,
compra-se o mundo.
No meu tempo mal
se via a terra
às escuras. Uma
luz satélite, um olho
artificial,
uma luz de fruto
verde frio por fora
operava esse
milagre, essa visão.
Meu pai, que se
ausentara,
sabia que seu pai
ia ser morto.
Estendia-se a
roupa sobre o fogo.
Crescia o pão
largo como uma
ampola de
penicilina, em tempo de guerra
de guerrilhas.
Luiza Neto Jorge
Sem comentários:
Enviar um comentário