Quando há dias Mr. Ié-Ié colocou por aqui a fotografia
da placa, que num edifício em Lisboa, nos diz que ali viveu Luis de Sttau
Monteiro, ficou à conversa com JC a lembrar um escritor que caiu no completo
esquecimento.
Contou então que fora na “Livraria Anglo-Americana,” ali no Cais do Sodré, Rua
Bernardino Costa, 32, Lisboa 2 – Telefone 327703, que comprara a
edição-fora-do-mercado de “Terra Santa”, que valeu a Sttau Monteiro uns tempos
passados em Caxias.
7 de Abril de 1967
O Magalhães Godinho, esta tarde:
O Supremo Tribunal de Justiça negou, por unanimidade o “Habeas Corpus” ao Sttau
Monteiro.
E com voz nítida e articulada, para o futuro ouvir bem, repetiu:
- POR UNANIMIDADE.
A palavra “unanimidade” ainda conseguiu assombrar o grupinho…
Nem um, ao menos? Nem um juiz, ao menos?
José Gomes Ferreira em “Dias Comuns”, Vol. II
Eduardo Olímpio, alentejano de Santiago do Cacém, não teve lições de livros
doirados, nasceu entre as dobras de ventos e trigos mas nunca traiu os amigos,
como diz numa canção de que é autor, ou “um cavalo de perder corridas” como
gostava de se chamar, foi, até ao seu encerramento, empregado da “Livraria
Anglo-Americana”.
Com ele estabeleceu laços de amizade e cumplicidade. Quando certos livros
chegavam à livraria, e ele sabia que não tardaria muito que a PIDE por lá
passasse para os apreender, guardava um exemplar. Sabia o que esta casa
gastava.
Gratas recordações. Conversas sem fim.
Pena a “Zarzuela” não ter um bagaço decente para
acompanhar a bica enquanto se olham as raparigas, dizia o Eduardo já com a
cara a avermelhar.
Ao Lado da “Anglo-Americana” havia a Pastelaria “Caneças”. Tempos depois do 25
de Abril, a “Caneças” transformou-se em Boutique do Pão e mais tarde amplia as
suas instalações comprando a “Anglo-Americana", onde se vendia um outro
tipo de pão.
Um pão vale mais que um Shakespeare?
Alguém a murmurar: words words, words…
Em redor da “Anglo-Americana” havia todo um mundo daquilo que todos chamavam
porta-aviões.
A barra mansa do “British-Bar”, o velho “English-Bar”, quase um clube inglês
daqueles dos romances policiais, hoje está lá uma cervejaria, do outro lado da
rua o “Bar Americano” onde o José Cardoso Pires se sentava em silêncio, copo de
whisky sobre a mesa e, ao lado, o “Califórnia”, café, restaurante, bilhares na
cave, também barbeiro e manicure, kioske de jornais e revistas e o António, ao
findar-da-tarde-quase-noite, a fritar uns “pregos”, carregados de alhos, ovo a
cavalo, fininhos com dois dedos de espuma.
E se ele um dia perde a memória de tudo isto?
Não quer pensar nisso, chega à janela das traseiras e grita: – “Oh Incas, oh
incas, oh sol d’Asía!”.
PS - O título do “post” é roubado ao Mário-Henrique Leiria, a fotografia é
tirada, num dia cinzento, por um incrível caixote Kodak, máquina que deixou
numa qualquer mesa, num qualquer balcão. A “Anglo-Americana” é naquela esquina
onde se pode ver um reclame aos cigarros “Chesterfield”.
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