De Salazar talvez se possa dizer que sabia de finanças, mas não tinha biblioteca.
Lia uns livros avulso que os ministros lhe levavam quando iam a despacho, passava os olhos pelo Diário de Notícias.
Mas segundo li no JL, deu-se ao cuidado de tecer algo sobre um livro de Ruben A.
«Caiu-me ontem debaixo
dos olhos um livro, Páginas II, de
Ruben A., que me dizem ser leitor de Português em Londres, escolhido portanto
ou patrocinado pelo Instituto de Alta Cultura. Pertence a uma boa família do
Porto – Andresen, creio. O livro, ou é de um louco ou de um sujeito que, tendo
dinheiro para pagar um livro de dislates, se propôs rir-se de todos nós. Há
páginas inteiras completamente ininteligíveis e irredutíveis na análise das
regras da gramática portuguesa, recheadas de termos de invenção do Autor e
formadas sem tom nem som. Explora-se o reles, o ordinário, o palavreado porco,
não só da língua literária, mas do falar corrente.
As porcarias,
obscenidades, palavrões juncam o livro. Em certas passagens é chocarreiramente
desabrido com os ingleses. Parece-me que o livro pertence a uma onda
modernista, e não é um caso para a Censura e para a polícia de costumes. Mas se
o autor é leitor em Londres, temos nós de ver o que escreve e como escreve. Em
conclusão: o Autor não pode representar Portugal nem ensinar português. Esse é que é o ponto essencial a tratar com
o Instituto de Alta Cultura. E já não falo de certas morais ou sexuais do livro
se vê que o Autor deve pertencer aí a um círculo de pessoas que a polícia
persegue.»
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