quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

CRUISER A. PUSHKIN


Lembra-se de um verso, num poema de António Reis, «há sempre um rapaz triste em frente a um barco.»

Gosta de começos de livros e agrada-lhe muito o de «O Ano da Morte de Ricardo Reis», de José Saramago, quando o autor revela que o «Highland Brigade», vapor inglês da Mala Real, que atravessava o Atlântico entre Londres e Buenos Aires, chegou por uma tarde chuvosa ao cais de Alcântara e dele desembarcou Ricardo Reis.

Ocorre-lhe a engraçada a história de Jorge Lima Barreto a explicar, no primeiro disco de Eugénia Melo e Castro, que lhe tinha sugerido o nome artístico de Eugénia C, porque se lembrava de um elegante paquete, que andava entre Lisboa e o Rio de Janeiro.

Gosta de ver, do alto das Janelas Verdes, os paquetes ancorados no cais de Alcântara e, não sabe bem porquê, cada vez que os olha, fica a trautear a «What have they’vedone to my song, Ma», da Melanie Safka «vê o que fizeram com a minha canção, ma!É a única coisa que eu sei fazer mais ou menos bem... e deram cabo dela. Quem me dera encontrar um bom livro, para viver dentro dele. Mas... pode ser que tudo acabe bem, mãe. Pode ser que tudo dê certo. Se as pessoas estiverem compradoras de lágrimas, um dia destes vou ficar rica» e vai pensando que um dia ainda há-de viajar num daqueles paquete».

Este disco tem a referência C92-13392, a etiqueta está em cirílico, mas a tradução, a fazer fé no que «Mr. Ié-Ié», algures lá para trás nas páginas do blogue escreveu, deverá ser «Melodia».
É um EP de 33 rpm, coisa pouco vulgar. Pensa que funcionava como «musical souvenir» para os passageiros que viajavam no paquete soviético «A. Pushkin» e é tocado pelo agrupamento musical de bordo, que animava as tardes e noites dançantes. Pelo menos é isso que as fotografias, publicadas na contra capa, sugerem.

São tocadas e cantadas quatro canções do folclore russo com a inevitável «Kalinka».

Conclui que é um disco de propaganda, pois não está a ver os passageiros do cruzeiro que, normalmente são gente do norte da Europa, com algum gosto, a interromperem o jantar de iguarias, regado a champanhe e glamour, para irem dançar a «Kalinka»., a não ser que estivessem muito bem bebidos. 

Hoje, ainda adormecerá deixando que «Trains, Boats and Planes» passem lentos pela imaginação a caminho de uma direcção que não consegue vislumbrar qual é. 

Como não encontrou nenhuma gravação do conjunto privativo do paquete russo, arrisca a canção que trauteia quando olha os barcos no Cais de Alcântara: Melanie Safka a cantar «Look what they’ve done to my song, Ma».



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