O Evangelho Segundo Jesus Cristo
Editorial Caminho, Lisboa Outubro 1991
Jesus Cristo segundo José Saramago.
Em 1991, José Saramago publica “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”.
Um livro que levantou muitas e diversas polémicas, uma delas, completamente ridícula, que mete o governo de Cavaco Silva, Santana Lopes e um tal de Sousa Lara, ao recusarem a inclusão do livro na lista de candidatos ao Prémio Europeu de Literatura. Entendiam as sumidades que Saramago atacava princípios que tinham a ver com o património religioso português, dividindo os gentios pátrios.
“Eu vivo nesta sociedade: portanto ateu, comunista e tudo isso, Não me retira o direito de questionar ou de estudar uma figura que é decisiva, é a figura fundamental na civilização em que eu vivo.”, respondeu Saramago, quando um dia lhe perguntaram porque sendo tudo isso, se resolveu a escrever o livro.
Talvez pela polémica suscitada pela sousalarada, a Associação Portuguesa de Escritores atribuíu ao livro o “Grande Prémio”, referente ao ano de 1991.
Convém lembrar que até aí, José Saramago tinha sido um “preterido histórico” do Grande Prémio da Associação Portuguesa de Escritores
Em 1982 “Memorial do Convento” perdeu para “Balada da Praia dos Cães” de José Cardoso Pires.
Em 1984 “O Ano da Morte de Ricardo Reis” para “Amadeo” de Mário Cláudio.
Em 1986 “Jangada de Pedra” para “Um Amor Feliz” de David-Mourão Ferreira
Em 1989 “História do Cerco de Lisboa” para “Fora de Horas" de Paulo Castilho
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Um acto de justiça que já tardava mas, “Memorial do Convento” ou “O Ano da Morte de Ricardo Reis” teriam merecido muito mais o Grande Prémio.
Mas os prémios, sejam eles quais forem, valem o que têm de valer.
O livro, em que o narrador antipatiza francamente com Deus simpatiza com Jesus, termina assim:
Jesus morre, morre, e já o vai deixando a vida, quando de súbito o céu por cima da sua cabeça se abre de par em par e Deus aparece, vestido como estivera na barca e a sua voz ressoa por toda a terra, dizendo, Tu és o meu Filho muito amado, em ti pus toda a minha complacência. Então Jesus compreendeu que viera trazido ao engano como se leva o cordeiro ao sacrifício, que a sua vida fora traçada para morrer assim desde o princípio dos princípios, e, subindo-lhe à lembrança o rio de sangue e de sofrimento que do seu lado irá nascer e alagar toda a terra, clamou para o céu aberto onde Deus sorria, Homens, perdoai-lhe, porque ele não sabe o que fez. Depois, foi morrendo no meio de um sonho, estava em Nazaré e ouvia o pai dizer-lhe, encolhendo os ombros e sorrindo também, Nem eu posso fazer-te todas as perguntas, nem tu podes dar-me todas as respostas. Ainda havia nele um resto de vida quando sentiu que uma esponja embebida em água e vinagre lhe roçava os lábios., e então, olhando para baixo, deu por um homem que se afastava com um balde e uma cana ao ombro. Já não chegou a ver, posta no chão, a tigela negra para onde o seu sangue gotejava.
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