quarta-feira, 28 de julho de 2010

COISAS EXTINTAS OU EM VIAS DE...


Ontem, quando aqui contei que abri o livro Os Poemas Possíveis de José Saramago, com uma faca própria para abrir livros, que também servia para abrir as cartas, quando havia cartas, quando as pessoas, por escrito, se correspondiam, lembrei-me de um velho texto de Jorge Listopad publicado na sua coluna «Secos &Molhados» que, durante anos, manteve na última página do «Diário de Notícias.»

Essas notas, essas fichas, foram, mais tarde, reunidas em livro, que Listopad também titulou como Secos Molhados.

É dele que transcrevo O Caso da Faca de Papel:

De repente senti saudade da velha ferramenta do jovem leitor que fui. A faca de papel.
Hoje em dia são raros os livros que precisam de faca para abrirem as páginas; os livros vendem-se já com as páginas cortadas. Sem dúvida, a leitura é mais cómoda. Ganhe-se em tempo o que se perde por outro lado: em “controle” de que o livro “foi” aberto e não é apenas uma prenda platónica ou um ornamento de biblioteca; em higiene e, sobretudo, no sentimento de sermos nós os primeiros a abrir as páginas do mistério do novo mundo que cada livro representa, fechado. Sem esquecer que esse tempo de trabalho manual, habitualmente acompanhado de umas primeiras paragens de leitura supragiagonal, mas quão impressiva, representa um contacto físico e quase amoroso com o papel impresso que é mais do que isso.
A ferramenta fora de uso morre. A faca de papel, belo objecto, está a desaparecer. E com ele talvez certa leitura.

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